Another Sight
Falam em Neil Gaiman e o André quer, mas terei tido mais olhos do que barriga? Um pouco. Já não é a primeira vez que comparam um jogo às obras de Gaiman – poder deitar as mãos a um jogo que bebe da sua obra é um sonho que tarda em se realizar.
Temos os livros, as BD, as séries, cadê os jogos? Há o Wayward Manor, mas esse é mais de terror pela qualidade do que pelo enredo.
A descrição fazia referência a Neverwhere, uma história que se passa nos interstícios de Londres; nas sombras; no canto do olho; nas brechas da nossa realidade. É uma obra linda que nos faz pensar no que se esconde à nossa frente… E a Lunar Great Wall Studios quis recuperar essa temática e levar-nos para o fim da era vitoriana, para uma Londres onírica.
O esforço e a paixão estão lá – sem dúvida, mas deu-me mais pesadelos e frustrações do que outra coisa.
Vamos à premissa: controlamos a Kit, uma adolescente corajosa, mas diria mimada pelo tom de voz, e o gato ruivo, Hodge. A Kit está a explorar uns túneis porque é tola e há um acidente; a Kit cai e perde a visão, mas o que deveria ser uma calamidade, é apenas uma terça-feira porque parece que não se passa nada. E, logo de seguida, encontra o gato Hodges.
Os dois terão de cooperar para encontrarem o caminho de volta, mas o que poderia ser uma aventura épica, é um pára-arranca durante a hora de ponta. Podemos alternar entre as duas personagens, cada uma com as suas características próprias: o gato vê o mundo normalmente, mas não pode fazer mais nada que não o explorar, já a Kit está confinada à sua cegueira, com uma bolha de luz ténue a rodeá-la para podermos acompanhar a ação. É um efeito engraçado, admito, que se expande com os sons, como passos ou miados do gato. Isto funciona como um sonar para guiar a nossa personagem, pois é ela que interage com as várias ferramentas do cenário.
Não achei esta mecânica tão boa como deveria ser porque sentia que não estava a avançar de forma fluida. Ainda por cima, a Kit não corre quando está longe do gato… Sim, eu sei que é cega e é um detalhe…
Ainda a nível de desempenho, deparei-me com algumas situações caricatas, a primeira foi logo quando iniciei o jogo e achei que o texto estava com pequenas falhas de píxeis, mas quando fui ver vídeos de outras consolas, acontecia o mesmo lá…. E fiquei preso no cenário sem me conseguir mexer. Saí dessa situação, trocando várias vezes de personagem até conseguir mover a rapariga.
Não fiquei fã do estilo visual usado pelo estúdio milanês e achei que não transmitia bem o espírito fantástico que almejavam. Estando a jogar Child of Light em simultâneo, não posso não comparar os dois cuja mensagem é quase-quase semelhante, mas ao passo que um tem uma atmosfera forte em fantasia e no estranho, o outro parece um jogo mobile. Já a nível sonoro, tanto as vozes como a banda sonora não me deixaram grandes memórias ou desejo de repetir a experiência. Só sei que quando mando o gato miar, o meu próprio gato levanta as orelhas, portanto alguma coisa está a funcionar.
Atando tudo num lacinho bonito, Another Sight não é um jogo mau, mas também não é muito bom. Tem boas intenções, abusa dos chavões emocionais, envolventes, épicos, mas é um duche de água morna porque o gás está a terminar. Só nos queremos despachar e partir para algo melhor, mas o melhor é relativo. Se conseguirem ultrapassar os detalhes menos bons, não será tempo desperdiçado.
Nota: Esta análise foi efetuada com base em código final do jogo para a Nintendo Switch, gentilmente cedido pela Toplitz Productions.