Yamataï

Artigo por João Efigénia

Yamataï. Um místico arquipélago no Mar da China. A sua Rainha, Himiko, deu a todos os empreiteiros do seu reino a missão de construir a capital de Yamataï, obtendo prestígio da Rainha Himiko e sendo grandemente recompensados. Quem será o memorável grande construtor do reino de Yamataï?



Yamataï (2017) é um jogo de estratégia competitivo para 2 a 4 jogadores, com duração entre 60 e 120 minutos. Na verdade, a duração de uma sessão é a característica mais volátil do jogo, pois a multitude de opções disponíveis em cada ação vai inevitavelmente provocar momentos PA (paralisia da análise) até nos jogadores mais experientes. Não é um jogo gateway para novos jogadores, mas é um excelente jogo para introduzir mecânicas diferentes após uma ou duas sessões de jogos, quando se está a acolher novas pessoas.

Publicado pela Days of Wonder, pela mão de Bruno Cathala e Marc Paquien, e com belíssimas ilustrações de Jérémie Fleury e design gráfico de Cyrille Daujean, Yamataï é um jogo que enche a vista e o cérebro, como poderão ver pelas imagens que acompanham esta review. É, sem dúvida, uma pérola perdida no catálogo da Days of Wonder, que passou debaixo do radar de muitos boardgamers.


Yamataï é, na sua essência, um jogo de expansão territorial. Os jogadores têm 6, 8 ou 10 edifícios, dependendo do número de jogadores, que deverão construir para ganhar Pontos de Prestígio (PP). Estes edifícios são construídos através da alocação de barcos coloridos, cada cor representando um tipo de recurso, nos espaços entre as ilhas do arquipélago. Quando uma ilha tiver um determinado número de barcos a rodeá-la, o jogador poderá construir lá um dos seus edifícios, de acordo com o seu custo em barcos, e receber os PP correspondentes. 

Os barcos não são do uso exclusivo de cada jogador: uma vez colocados no arquipélago, podem ser usados como recurso para construir noutra ilha adjacente. Uma vez usados, não são removidos do tabuleiro, exceto através de alguma ação especial que explicarei à frente.

Existem também 18 especialistas, que são personagens que podem ser recrutadas. Estes conferem PP (ou não), benefícios de final de jogo, e modificam as ações base do jogo. Não há um mau especialista, pois existem estratégias para dar uso pleno a todos eles.

O jogo termina, dizendo de forma curta e grossa, quando acabar alguma coisa: uma cor de barcos, os edifícios de algum jogador, o mercado de edifícios ou o mercado de especialistas. Quando isto ocorre, os jogadores restantes da ronda fazem as suas ações e o jogo acaba. Contabilizam-se os PP de todos os elementos na posse dos jogadores, o dinheiro converte-se em PP, sofrem-se as penalizações se as houver, e o jogador com mais prestígio é o vencedor, o grande empreiteiro de Yamataï.

Vamos então à jogabilidade. Os jogadores fazem turnos por uma ordem que é determinada pelas escolhas que fizeram na ronda anterior. Na primeira ronda do jogo, é selecionado um jogador aleatoriamente. Cada turno é composto por 5 fases, duas das quais obrigatórias. Cada jogador recebe um pequeno tabuleiro onde coloca o dinheiro, os barcos de reserva, e os edifícios por construir, e que explica cada ação de forma pictográfica. Os jogadores começam também com algumas moedas. Vou agora descrever cada uma das fases em detalhe.


Fase 1 – Escolher uma frota (obrigatória)

Na base do tabuleiro está a Pista de Frotas. Nela encontram-se 5 tiles de frotas virados para cima, e 5 virados para baixo, em dois lados separados. O jogador tem de escolher uma frota, receber os barcos indicados, e ganha a possibilidade de utilizar o benefício que a frota lhe dá. Estes “poderes” opcionais podem ser desde eliminar 2 barcos do arquipélago (e assim livrar terreno para construir edifícios), reservar um edifício do mercado de edifícios para si, ou até colocar um Dragão Sagrado numa ilha vazia à sua escolha. Estes dragões são, efetivamente, a única forma de atacar ou prejudicar diretamente os outros jogadores, pois ninguém poderá construir numa ilha em que esteja um Dragão.

Cada frota tem também um número no seu tile: no final da ronda, e após todos os jogadores terem tido o seu turno, prepara-se a ordem da próxima ronda pelo número da frota de cada jogador, por ordem crescente. Ser a frota número 1 implica só receber um barco. Já a frota com mais barcos (3) tem o número 10, o que garante que quem a escolha será o último na ronda seguinte.

A escolha da frota é um elemento estratégico que permite dar a volta ao turno ainda antes de ele sequer acontecer. E é também a fase em que os jogadores mais vão ponderar nas suas decisões, pois é conveniente escolher uma frota que lhes dê os barcos de que necessitam para construir. É definitivamente a fase mais calculista.


Fase 2 – Comércio (opcional)

Nesta fase, o jogador pode comprar ou vender barcos. Na verdade, barco. O jogador tem direito a fazer uma transação de um barco, pagando o valor em moedas dependendo da raridade dos barcos: uma moeda os verdes, de bambu, quatro moedas os vermelhos, de barro. Os barcos dourados, de ouro, não podem ser comprados ou vendidos. Há um especialista (mais à frente) que desbloqueia esta habilidade.


Fase 3A – Colocar barcos (opcional)

Nesta fase, o jogador pode colocar os barcos que adquiriu na sua ronda, assim como os barcos que tem na sua reserva. Os barcos devem ser colocados nos espaços circulares entre as ilhas, de forma a tocar nas suas margens, sempre adjacentes a um barco já existente no arquipélago e, caso seja colocado mais do que um barco, estes devem formar uma fila ininterrupta. O primeiro barco da fase a ser colocado tem de ter a mesma cor do barco adjacente já existente. Ou seja, para colocar um barco adjacente a um barco verde, esse barco terá de ser verde. Os barcos seguintes podem ser colocados em qualquer ordem, mas em fila.

Fase 3B – Recolher recursos ou Construir (mandatório, se possível)

Esta fase complementa a anterior. Nela, o jogador faz uma de duas coisas: ou recolhe os recursos naturais existentes nas ilhas adjacentes aos barcos que colocou, em número igual aos barcos que colocou, ou constrói um edifício dos 5 disponíveis do mercado de edifícios. Cada edifício tem um custo determinado de navios, e PP variantes. O jogador poderá construir edifícios numa ilha desde que tenha colocado um barco adjacente à mesma nesse turno. Quando constrói, coloca um dos edifícios do seu tabuleiro de jogador nessa ilha. Se construir um edifício numa ilha com uma montanha, receberá um PP adicional. Se construir um edifício numa ilha adjacente a outra onde já exista um Palácio, ou Torii, também recebe um PP adicional. Se construir junto a outros edifícios seus, formando um aglomerado da sua cor, recebe moedas em igual número ao número de edifícios desse aglomerado.

Os Palácios são edifícios especiais do mercado. Têm requisitos de construção mais elevados, mas dão mais PP no fim do jogo, e o jogador não usa um dos seus edifícios para construir, mas sim outras peças, de cor vermelha. Não pertencem a ninguém nem contam para os aglomerados de um jogador.

Não é possível construir em ilhas que tenham Dragões Sagrados.


Fase 4 – Colocar barcos no porto

No seu tabuleiro, os jogadores têm um espaço marcado com uma âncora: serve para, nesta fase, colocar um barco para ser utilizado em rondas posteriores. Só há espaço para um barco. Se descartarem mais do que um barco, eles ficarão inutilizados e são guardados na área indicada, e cada par de barcos inutilizados tem uma penalização de 2 PP no final do jogo.


Fase 5 – Contratar especialistas

Nesta fase, os jogadores usam os recursos que recolheram das ilhas do arquipélago para contratar um especialista à escolha do mercado de especialistas. Podem usar 2 recursos iguais ou 3 diferentes. Esse especialista vale PP (ou não) no final do jogo, conforme indicado na sua carta, e conferem poderes especiais, como a habilidade de remover Dragões Sagrados, fazer duas transações na fase 2 ou aumentar a capacidade do porto. São 18 à escolha e são essenciais para a vitória, pois valem tantos ou mais PP do que os edifícios.



Após todos os jogadores terem tido a sua vez, é feito o chamado reabastecimento, isto é, voltam-se a encher os mercados de edifícios e especialistas, e o próximo grupo de 5 frotas é preenchido. Os jogadores são distribuídos no marcador de ordem de turno tendo em conta a frota escolhida anteriormente, e inicia-se a ronda seguinte. Se já não houver barcos de alguma cor, ou se um jogador já não tiver edifícios disponíveis, ou se não houver reposição de especialistas ou edifícios, o jogo acaba imediatamente. E se acabar, os pontos são contabilizados e o jogador com mais PP ganha.

Resumindo, Yamataï é um jogo de escolhas. Já o joguei incontáveis vezes com diversas pessoas, e é facto de que não há uma estratégia que seja vitória garantida: um jogador pode optar por investir exclusivamente em edifícios fáceis e rápidos de construir, que valem menos pontos, e correr para a meta (isto é, esgotar o seu número de edifícios) para não dar tempo aos outros jogadores de construir edifícios mais valiosos. Ou pode nem construir e fazer um jogo apoiando-se mais na recolha de recursos e contratação de especialistas. Há também aquele jogador manhoso que escolhe sistematicamente a frota #5, que permite colocar um Dragão Sagrado numa ilha à escolha, e assim atrapalhar os jogadores adversários. 



O facto de haver 18 especialistas diferentes que modificam a maneira como o seu empreiteiro joga e como pontua, e as 10 frotas com ações diferentes, é o que realmente traz variedade ao estilo e agressividade ao jogo. O número de jogadores também impacta bastante a forma como o jogo flui e o número de opções: para primeiro jogo, aconselho a 2 ou 3 jogadores, para que haja espaço para respirar. O jogo a 4 é algo sufocante, pois são 4 jogadores a lutar entre si por determinadas ilhas ou edifícios e não é difícil ficar entalado.

O manual é um ponto forte do jogo: nele, existem tabelas com as funções de cada frota e os benefícios de cada especialista, para consulta rápida. Cada fase tem ilustrações com exemplos de possíveis ações, e o manual em si é bastante explicito e acessível, sem blocos de texto e com imagens mais do que suficientes para que não haja dúvidas.


Sendo uma oferta da Days of Wonder, os componentes são em madeira pintada. 34 edifícios de 4 cores, uma para cada jogador, mais 7 Palácios e Torii, 6 meeples, 80 pequenos barcos de madeira de 5 cores diferentes, e cartas de especialista, mercado e frota de cartão grosso dão uma sensação semi-premium ao jogo. Os componentes são resistentes e conferem uma qualidade que não é comum em jogos dentro da mesma gama de preço. 

Dizendo de outra forma, já paguei mais por menos. Como não tem cartas, o que poupam em sleeves aconselho que gastem na laminagem dos tabuleiros de jogador e o envernizamento dos componentes em madeira, para garantir que a cor se mantém. Ao destacarem as moedas, dragões, leques e todas as outras peças dos cartões de origem, coloquem os cartões vazios debaixo do insert do jogo para dar altura ao mesmo. Assim, os componentes ficam mais compactados e mantêm-se arrumados na caixa.


Pessoalmente, este é um dos jogos que mais trago à mesa. É mentalmente estimulante, desafiante e divertido. É de estratégia e tem os seus tempos mortos entre turnos, pois não é possível planear antecipadamente e a 100% a jogada seguinte, o que provoca PA. É descontraído e no final garantidamente que há uma reviravolta na contagem dos pontos devido aos especialistas. Mais do que aconselhado!

Prós:

  • Arte e componentes elegantes e espetaculares pela sua simplicidade;
  • Enorme variedade de estratégias e possibilidades: não há dois jogos iguais;
  • Forte componente analítica, ideal para jogadores que gostam de ser desafiados turno a turno.

Contras:

  • Paralisia de análise poderá ser muito frequente, dependendo do tipo de jogador;
  • Duração imprevisível de sessões: uma sessão a 4 jogadores poderá durar entre 60 e 120 minutos, ou até mais, dependendo das estratégias utilizadas e da velocidade de tomada de decisão.


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