FIFA 23


A EA Sports despede-se do nome FIFA ao fim de uma parceria de 30 anos que nos trouxe alguns dos simuladores futebolísticos mais bem-sucedidos de sempre. É verdade que alguns foram mais aclamados pela crítica que outros (não podemos ter um FIFA 14 ou um FIFA 10 todos os anos), mas na minha opinião, o FIFA 23 faz o suficiente para restituir à série algum do orgulho e respeito que os mais recentes títulos lhe tiraram.

À semelhança da prestação de uma equipa de futebol, a qualidade do FIFA 23 não pode ser aferida sem uma avaliação individual de cada um dos seus diferentes elementos. É isso que vou fazer, dando uma nota a cada um dos aspetos do mais recente título da EA Sports.

Jogabilidade: 8/10

Eu sei, controverso. Pela minha experiência, e pelas diversas opiniões que já consegui sondar sobre as mudanças feitas à jogabilidade do FIFA 22 para o FIFA 23, uma coisa se tornou clara: não é do agrado de todos. Aliás, parece que a vasta maioria de opiniões alternam entre "gosto muito, é um passo na direção certa" e "é horrível, deixei-me jogar FIFA 22 outra vez". E claro, eu sei que nem todos terão opiniões tão extremas, mas parece ser numa destas duas categorias que a maioria das opiniões se pode encaixar. Pessoalmente, eu encaixo-me no primeiro grupo de pessoas. Mas este não foi o meu primeiro pensamento. Quando joguei a minha primeira partida de FIFA 23, foi necessário menos de 1 minuto para eu pensar: "lento". E sim, o FIFA 23 é mais lento que o FIFA 22. É mais lento que qualquer um dos FIFAs de que eu me recordo de anos recentes. Mas depois comecei a perceber que isso não é um defeito, mas sim a virtude que eleva este título acima da maioria dos seus predecessores. A jogabilidade de FIFA 23 encoraja um jogo lento e metódico, que valoriza a construção de jogo com uma ênfase na manutenção da posse de bola, ao invés dos constantes passes longos para a desmarcação de extremos rápidos que marcaram os mais recentes títulos. Agora, são verdadeiramente raros os jogadores que conseguem usar a sua velocidade para voar pelo campo em direção à baliza adversária e as desmarcações dos avançados são menos comuns, mas não inexistentes. Juntando a isso o facto de o passe em profundidade já não ser a solução para tudo, temos um jogo onde será necessário fazer mais passes curtos, tentando desconstruir a defesa adversária e aí sim, jogar a bola na profundidade para a desmarcação que demora a chegar, mas que é extremamente satisfatória quando aproveitada com sucesso.


Onde se verificam as maiores melhorias é na IA do adversário, principalmente durante os ataques do jogador, que - e falo por experiência - acaba muitas vezes frustrado pelo insucesso das suas tentativas de chegar à área adversária. A oposição parece ser muito mais inteligente e mais capaz de prever os movimentos do jogador do que em anos anteriores, e as novas animações mais realistas, tanto dos jogadores de campo como dos guarda redes contribuem para uma maior imersão em cada partida. O caráter mais deliberado da jogabilidade deste FIFA significa que simplesmente correr com a bola em direção ao golo já não resulta, principalmente se não fizeres uso do analógico direito para driblar. Quando correm em velocidade, os jogadores podem escorregar e perder a bola se tiverem de mudar de direção de forma brusca, por isso terás de ter cuidado ao escolher a tua abordagem ao ataque.

Existem outras novidades como o Power Shot, um remate potente, como o nome indica, que precisa de mais tempo para ser executado, dando aos defesas uma oportunidade de roubar a bola ao adversário antes de este disparar à baliza. As bolas paradas também mudaram: desapareceram os círculos para apontar à baliza na marcação de livres curtos e penáltis, ou para escolher onde colocar a bola nos livres longos e cantos. Foram substituídos por um novo sistema que permite ao jogador escolher de forma mais intuitiva em que zona da bola quer bater e que efeito lhe quer dar.


As novidades presentes na jogabilidade do FIFA 23 não serão do agrado de todos (estou a olhar para vocês, pro players), mas, na minha opinião, o jogo mais lento, metódico e deliberado torna os jogos de FIFA mais realistas e táticos, não sendo suficiente encher uma equipa de Adama Traoré's para chegar à vitória.

Gráficos: 7.5/10

Não queria mesmo dar pontuações intermédias, mas no que toca ao aspeto visual do FIFA 23, não consegui decidir-me entre um 7 e um 8.

Por um lado, temos um jogo lindíssimo, com a melhor relva que eu já vi, que reage ao rolar da bola e aos carrinhos dos jogadores - acreditem, a relva é fenomenal. Além disso, 9 em cada 10 jogadores com faces reais têm uma parecença à realidade que chega a ser ridícula, e neste aspeto, a EA Sports continua a desafiar os limites daquilo que é possível no que toca ao nível de fidelidade com que é possível reproduzir a face de um humano num videojogo.


O FIFA 23 conta com novas animações faciais, e foi este aspeto que realmente me impressionou quando comparado com os títulos de anos anteriores. Os jogadores reagem de forma cada vez mais realista ao esforço que fazem para correr, rematar, ou roubar a bola ao adversário, e o mesmo acontece com os seus cabelos, que reagem de forma natural aos movimentos de cada jogador. Isto significa que uma (não pequena) parte das minhas 26 horas de jogo foi passada a utilizar a repetição para andar para a frente e para trás e a divertir-me com as animações faciais e os movimentos do cabelo de jogadores como Jack Grealish. Se estou orgulhoso? Não. Arrependido? Nem por isso.

Da esquerda para a direita: Otávio, Alphonso Davies, Erling Haaland e Sam Kerr

Infelizmente, as novas animações faciais e as magníficas representações das faces das maiores estrelas do futebol mundial não me entreteram tempo suficiente para eu não reparar nas caras... menos bem-conseguidas, digamos. Esta categoria inclui um pouco de tudo, desde caras que é suposto serem fiéis à realidade, mas ficam aquém (por exemplo, Jack Grealish), como as famosas caras genéricas que eu apenas posso descrever como aquilo que um extraterrestre desenharia se lhe explicassem muito por alto o aspeto que uma face humana costuma ter. Exemplos deste último grupo são o MVP da época 21/22 da Serie A, Rafael Leão, o brasileiro Bruno Guimarães, que tinha a sua cara real no FIFA 22, entre outros.

Da esquerda para a direita: Jack Grealish, Rafael Leão, Bruno Guimarães e Ronald Araújo

E sim, eu sei que é comum saírem patches ao longo do ano que resolvem alguns destes casos. Também sei que é praticamente impossível, dado o número de equipas e de jogadores que existem em qualquer FIFA, que todos eles tenham a sua face verdadeira no jogo. Mas o facto de haver jogadores que, segundo eles, tiveram a sua face digitalizada pela EA e que, à data do lançamento do jogo, têm uma cara genérica, acaba por tirar algum do brilho que trazem a maioria das faces realísticas presentes no jogo.

Modo Carreira: 6/10

Vira o disco e toca o mesmo. Mais um ano, mais uma série de oportunidades para melhorar o modo carreira, mas, ultimamente, um resultado desapontante, que não deixa de ser familiar.

Como ávido jogador do modo carreira, é sempre uma desilusão vê-lo rebaixado para segundo plano, em favor do seu "irmão" mais vistoso, o FUT. A inclusão da opção de usar um treinador real era algo que eu já esperava há alguns anos, dada a minha total inaptidão para criação de personagens, por isso, quando soube que esta opção estaria presente no modo carreira do FIFA 23, confesso que me senti esperançoso. E esta poderia ter sido uma inclusão agradável, não fosse a escassez de treinadores que têm as suas faces verdadeiras no jogo. Na Liga Bwin, apenas Sérgio Conceição (FC Porto); na La Liga, apenas 4 treinadores para além dos óbvios Carlo Ancelotti (Real Madrid), Diego Simeone (Atlético de Madrid) e Xavi (FC Barcelona). Até na Premier League, que tem, provavelmente, a maior percentagem de jogadores com faces verdadeiras, faltam imagens realísticas de Mikel Arteta (Arsenal) e Erik Ten Hag (Manchester United), entre outros. Mais estranho é o caso da Bundesliga e da Ligue 1, onde os únicos treinadores disponíveis são Edin Terzić (Borussia Dortmund) e Christophe Galtier (PSG), apesar de nenhum deles ter a sua face no jogo, ou o caso da Serie A, onde não há um único treinador cuja face seja minimamente realista. Algo que teria sido interessante incluir com esta funcionalidade seriam treinadores que se encontram desempregados como Mauricio Pochettino ou Thomas Tuchel, cujas imagens estiveram presentes em títulos de anos anteriores (se bem que, como vimos no caso de alguns jogadores, isso não é garantia de nada).

Há outras novidades, como as cutscenes que agora são reproduzidas depois da compra e venda de jogadores, bem como um sistema de avaliação destes negócios, mas infelizmente não são suficientes para tornar este modo mais interessante do que foi nos anos anteriores.


A inclusão do AFC Richmond e do seu treinador, Ted Lasso, foi fortemente publicitada pela EA Sports nas semanas que antecederam o lançamento do FIFA 23, mas tudo acabou por ser uma desilusão, devido ao facto de não haver nada que distinga a experiência de treinar como Ted Lasso ou como qualquer outro treinador. Não há voice-over do ator Jason Sudeikis, não há qualquer tipo de cânticos originais ou cutscenes especiais, não há nada de interessante aqui, apenas um desperdício de tempo e recursos que poderiam ter sido usados para tornar o modo carreira realmente interessante e capaz de cativar a atenção de cada um de nós durante mais do que os primeiros 2 meses após o lançamento.


À semelhança da carreira de treinador, a carreira de jogador tem algumas novidades, mas nenhuma melhoria excecional. Existe um novo sistema de personalidade do jogador, que afetará diferentes diferentes atributos do teu profissional consoante a sua personalidade dominante: rebelde, motor ou virtuoso. Isto será definido pelas tuas decisões (o que dizes à imprensa no final do jogo, por exemplo), compras (um curso de aulas de dança ou um colchão topo de gama, entre outros) e investimentos (uma equipa de e-sports, por exemplo).


O modo carreira continua a ser negligenciado pela EA Sports, e os bugs insistem em não desaparecer, seja o marcador que deixa de mostrar o resultado a meio do jogo, o gráfico que indica um rumor de transferência e que se esquece do jogador envolvido ou as entrevistas pós-jogo que falam de jogos que nunca aconteceram: em todas as entrevistas que dei até agora no FIFA 23, o jornalista fez algum tipo de comentário sobre o jogo anterior contra a equipa que acabara de defrontar, apesar de ainda estar na primeira volta do campeonato.


Há, no entanto, alguns pontos menos fracos, como as negociações que são um pouco mais exigentes e agora incluem um medidor de tensão, que ajuda a perceber o quão perto a outra parte do negócio está de sair porta fora, ou o acima mencionado sistema de avaliação dos negócios de compra e venda que fornece uma análise detalhada de cada negócio.


Apesar de alguns ajustes e novidades presentes no modo carreira do FIFA 23, é difícil ver onde estão as melhorias em relação ao FIFA 22.

Ultimate Team: 7/10

No extremo oposto à jogabilidade, num eixo que mede a quantidade de mudanças feitas a cada aspeto do novo FIFA, temos aquele que é, sem dúvida, o modo mais popular, o Ultimate Team. Em equipa que ganha não se mexe, e parece de facto ser essa a abordagem da EA Sports ao FUT.  As únicas mudanças notáveis são o novo sistema de química, que promete deixar até os jogadores mais experientes confusos quando começarem a jogar, e o novo modo FUT Moments, um conjunto de pequenos cenários com diversos objetivos que, após serem alcançados, recompensam o jogador com uma nova moeda, FUT Stars, que podem ser usadas para comprar itens e packs. Esta última parece ser uma tentativa de combater o elemento pay to win associado a este modo. No entanto, sendo esta a galinha dos ovos de ouro da EA, o esforço para desincentivar os jogadores a gastarem fortunas para melhorar as suas equipas não é muito grande. Ainda assim, o FUT Moments traz desafios pequenos e divertidos, e deixa-nos viver momentos das carreiras de Kylian Mbappé e Jürgen Klopp.


A boa notícia é que a EA tentou algo de novo. A má notícia é que o Ultimate Team continua a pertencer a quem estiver disposto a investir mais dinheiro na sua equipa.

Pro Clubs e Volta: 6/10

Tal como o modo carreira, temos no Pro Clubs e no Volta dois modos com grande potencial, que continuam a ser negligenciados ano após ano por não terem a capacidade de gerar receita da mesma maneira que o Ultimate Team o faz. Este ano foram agrupados pela EA Sports, o que, por si só, já diz muito sobre a sua atitude em relação a ambos.
O Pro Clubs é mais do mesmo, não há grande novidades. Não deixa de ser divertido juntar um grupo de amigos na mesma equipa e rir, seja do aspeto dos seus jogadores, como da (falta de) qualidade dos mesmos. Infelizmente, a EA parece relutante em investir o mínimo de tempo num modo tão adorado por todos.


Já o Volta, descendente do glorioso FIFA Street, conta com um divertido modo Arcade que parece ser a tentativa da EA de criar um Fall Guys futebolístico, com minijogos divertidos para jogar online.
À semelhança do modo carreira, é frustrante ver a EA a fazer o mínimo de esforço possível para melhorar estes dois modos ano após ano. Ainda assim, tanto o Volta como o Pro Clubs são fontes de diversão, ainda que sejam apenas uma amostra daquilo que poderiam ser.

Merecedora de uma observação individual é a inclusão das equipas de futebol feminino da Women's Super League e da Liga Francesa. Ainda que, na minha opinião, esta iniciativa não vá longe o suficiente (não vejo razão que justifique a impossibilidade de jogar o modo carreira com uma equipa feminina), não deixa de ser um passo positivo na direção de um jogo mais inclusivo, onde todos, sem exceção, possam ver e ser os seus heróis e heroínas.

No final de contas, o último FIFA acaba por ser mais do mesmo, com poucas novidades no que toca aos vários modos de jogo, mas é a sua jogabilidade inovadora que, a meu ver, o eleva a níveis que os seus predecessores não conseguiram atingir. Veremos o que nos traz o primeiro EA Sports FC.


Nota: Análise efetuada com base numa cópia adquirida pelo autor do artigo, para a PlayStation5.


Latest in Sports