Cadence of Hyrule - Crypt of the NecroDancer Featuring The Legend of Zelda
O que pode fazer um indie quando lhe é dado acesso a uma das maiores franquias do mundo dos videojogos? Foi precisamente isso que aconteceu aos criadores de Crypt of the NecroDancer. Não dá para imaginar a reação que tiveram quando lhes deram a possibilidade de desenvolver um novo jogo baseado no universo de Zelda, mas dá, sim, para ver no que resultou. Eis o jogo Cadence of Hyrule - Crypt of the NecroDancer Featuring The Legend of Zelda!
Havia muitas possibilidades a escolher na forma como seria feito o desenvolvimento deste jogo, mas a maior dificuldade terá sido encontrar um ponto de equilíbrio. Por um lado, Crypt of the NecroDancer era um título assumidamente difícil, com tanto de frustrante como de gratificante. Por outro, a série The Legend of Zelda é uma de jogos de aventura amada por milhões de jogadores de todo o mundo, muitos dos quais terão curiosidade em experimentar este novo título sem conhecer sequer o conceito de jogos "roguelike".
Cadence of Hyrule é um meio termo. Um cruzamento entre os combates rítmicos de NecroDancer e a exploração de Zelda, com um mapa de aventura gerado aleatoriamente no início do jogo, mas grutas e masmorras com cenários gerados aleatoriamente de cada vez que se morre e tenta outra vez. Até mesmo o grau de dificuldade é algo intermédio, de forma a não frustrar quem nunca experimentou o género.
Tudo começa quando, de forma misteriosa, Cadence é levada para o mundo de Hyrule. Não sabe como nem porquê mas, conforme a escolha do jogador, terá de acordar Link ou Zelda para que seja possível salvar-se Hyrule de um sono profundo que poderá acabar em destruição. Conforme se escolha uma ou outra personagem, o início do jogo será feito num local diferente, o que não será muito importante pois todo o mapa é gerado aleatoriamente no início do jogo. Dentro da aleatoriedade, há algumas regras, que asseguram que o mapa faça sempre algum sentido. Ainda assim, a proximidade de itens úteis para a aventura será sempre feita à sorte.
Cada nova aventura pode ser iniciada a 1 ou 2 jogadores, sendo que a experiência para dois consegue ser bastante mais acessível e também algo bastante agradável de se jogar - a probabilidade de haver um "Game Over" torna-se bastante inferior, pois um jogador consegue ir até um shrine para salvar o outro, antes que morram os dois. Mesmo assim, começando-se o jogo com apenas um jogador, é possível com o avançar da aventura desbloquear a opção para jogar a dois - a história conta apenas com ligeiras alterações. Na verdade, é mesmo uma experiência muito agradável, poder-se jogar um "Zelda" a dois, especialmente caso possam fazê-lo juntos do princípio ao fim!
De qualquer dos modos, um "Game Over" neste título não é uma coisa frustrante. Todos os inimigos mortos no mapa regressam à vida, exceptuando os especiais cuja morte tenha dado um prémio para o inventário do jogador. Há dois tipos de equipamentos, sendo que alguns desaparecem com a morte da personagem e outros são sempre equipáveis e utilizáveis. Mesmo assim, a morte permite gastar diamantes, algo que nunca se perde, de forma a que a personagem receba algum equipamento extra antes de regressar ao mundo para uma nova tentativa.
O cuidado com a acessibilidade do jogo foi tanto, que até mesmo uma funcionalidade aparentemente central do jogo é totalmente opcional. Tal como no jogo original, o ritmo da banda sonora é a peça principal da experiência de jogo. A cada batida, movem-se os inimigos, tal como se deverá mover o herói que os pretende derrotal. Cada inimigo tem o seu próprio padrão de movimentos e ataques, que obrigam o jogador a prestar atenção, aprender os diversos comportamentos e mexer-se ao ritmo da música. Quanto mais dentro do ritmo, maior o dano infligido e a recompensa obtida.
A música é, por isso mesmo, o tema central deste jogo. Em cada novo ecrã, o jogador será o primeiro a movimentar-se, iniciando o movimento de todos os inimigos no cenário. No início, pode parecer algo complicado, especialmente se a aleatoriedade do mapa tiver colocado áreas recheadas de monstros junto à zona onde se começou o jogo. Observar, desviar, defender, atacar... o combate consegue ser uma espécie de puzzle e por isso mesmo dá melhor recompensa quando se mata todos os inimigos sem levar dano. Limpando-se o ecrã, a música passa então para uma versão relaxada, libertando o jogador do intenso ritmo de combate.
É precisamente nesta questão que se vê o cuidado em chegar a todos os jogadores. Ritmo intenso, múltiplos inimigos em movimento, não é algo para toda a gente e, por isso mesmo, é possível jogar todo o Cadence of Hyrule com esta funcionalidade desligada a partir das opções. Ao fazê-lo, perde-se a principal razão do Crypt of the NecroDancer ter sido o sucesso que foi, mas o jogo continua divertido. Aqui, os monstros movem-se apenas quando o herói se move, mantendo-se a sensação de cada ecrã ser uma espécie de puzzle mas sem a pressão do ritmo musical. Por outro lado, se o que o jogador procura é algo mais intenso e difícil, há também a possibilidade de jogar com o dobro do ritmo original.
Naturalmente, para um jogo como este, uma boa banda sonora é fundamental. O compositor, Danny Baranowsky, teve como desafio a criação músicas baseadas em grandes temas de Legend of Zelda sem perder o estilo que fez de NecroDancer o jogo que foi. Há músicas que conseguem ser uma fusão perfeita das duas bandas sonoras, outras têm claramente mais destaque em uma das duas franquias. Em geral, está aqui um grande trabalho, especialmente no exterior das masmorras, mas fica-se com pena de não existirem mais zonas diferentes para explorar e ouvir ainda mais temas musicais.
Com quatro masmorras para explorar, juntamente com as respetivas regiões, mais uma área final que, naturalmente, será no interior do castelo de Hyrule, o jogo é relativamente pequeno. Há sacrifícios com a aleatoriedade. Para fãs de Zelda, a falta de sentido no mapa de jogo será notória e mesmo as masmorras, exceptuando na sua entrada com uma área fixa, serão algo sem puzzles ou grandes mistérios.
Em contrapartida, mesmo sendo relativamente pequeno, onde com cerca de 10 horas ou menos será possível completá-lo com 100% da exploração, é um título que facilmente se pode voltar a jogar múltiplas vezes, graças à sua aleatoriedade. Existe ainda a hipótese de jogar com "permadeath", ou seja, morrendo a personagem, acabou o jogo. Para os mais "hardcore", há mesmo um desafio diário neste jogo, onde todos os dias será criado um mundo aleatório com uma única tentativa disponível - conseguirão chegar ao fim e, se sim, qual o tempo do seu speedrun?
Sim, este jogo é claramente um meio termo entre dois universos que pouca coisa teriam em comum. De forma geral, bebeu muito mais inspiração da série Legend of Zelda, desde o aspecto visual até muitas das suas mecânicas de jogo, mas consegue manter os aspectos que fizeram de Crypt of the NecroDancer algo tão especial. Uma boa experiência de jogo, especialmente recomendada para quem procura uma aventura em modo cooperativo local, mas não só.
Nota: Esta análise foi efetuada com base em código final do jogo para a Nintendo Switch, gentilmente cedido pela Nintendo.