Crystar


Se há universos que nunca me fascinaram foi todo o movimento emo, cuja fase nos inícios dos anos 2000 já lá vai há muito e passou-me ao lado, ou a estética lolita que ainda hoje está bem presente no Japão, e até mesmo por cá, mas que deixo estar em paz. Dou por mim agora a jogar Crystar: um jogo que une estes dois universos. Uma aventura cujo tema é a morte, onde acompanhamos Rei Hatada numa demanda pelo purgatório para salvar a sua irmã, Mirai.


A sua estética, passando pela narrativa e personagens, grita em silêncio emo. O explorar do purgatório e as suas masmorras, todas elas demasiado semelhantes, estão cheias de Revenants: almas penadas agarradas às suas últimas memórias. Desde o modo como Rei entra em cada zona, simulando um corte no pulso, o tema do choro e das lágrimas, que se materializam em cristais (basta lerem o nome do jogo com atenção), às palavras que vão enchendo o ecrã à medida que derrotamos Revenants que depois levam Rei a chorar… acho que percebem a ideia.

Sendo um jogo originalmente lançado na PS4 e PC, em 2018, a conversão para a Switch está bem trabalhada, com vozes tanto em inglês como japonês à escolha. Não contamos com os 60 frames por segundo e, quando comparamos os ecrãs lado a lado, vemos todo um conjunto de efeitos especiais ausentes. Ainda assim o jogo está bastante bem otimizado, visualmente com uma imagem próxima do original sem grandes sacrifícios, portando-se bem tanto em modo handheld como na TV. Acaba por ser uma versão definitiva, com os DLCs do original já incluído.


Depois todo o elenco de personagens é composto jovens raparigas menores, ou aparentam ser, com decotes reveladores: ou seja, lolitas. É outro universo que não julgo, mas questiono e, pelo elenco, há uma ou outra personagem interessante. Mas na maioria ou são irritantes, previsíveis ou muito desinteressantes, dando um check num conjunto de clichés espectáveis. Ainda assim encaixa bastante bem na temática e estética do jogo, cria um ambiente meio soturno onde a morte está bem representada, com elementos meio steampunk, não fossem as gigantes engrenagens que são também um tema importante na história.

Essa história que é… bem, básica. Previsível, mas com algumas surpresas, um enredo e personagens que rapidamente percebemos os seus motivos, quem é herói ou vilão. Seguimos Rei cuja missão é salvar a sua irmã Mirai de chegar ao fundo do purgatório, composto por um gigante conjunto de rodas dentadas, e sem qualquer conhecimento de como entrou naquele mundo, juntamente com a sua irmã mais nova. As dúvidas existenciais de algumas personagens ajudam a desenvolvê-las, principalmente Rei e os membros da sua equipa, mas pouco vão além do que era expectável. O maior problema é mesmo o quão repetitiva é a aventura, os cenários praticamente sempre iguais com pouco ou nada de exploração, as missões que se baseiam em chegar a certo ponto e derrotar determinado inimigo, e isto acontece constantemente pelo jogo fora. Ainda assim é interessante, aborda de modo ligeiro o tema da morte, mas não se foca em demasia em bater constantemente no mesmo assunto. Explora devidamente as situações em que as personagens são colocadas e por norma sem grandes exageros.


Não fugindo à sua estrutura, é um RPG de ação simples e repetitivo, cuja jogabilidade se baseia num button mashing constante com um ataque rápido e outro mais forte, e pouca evolução, destruindo assim os inimigos que se cruzam conosco. Há um leque de ataques especiais que nos ajudam, principalmente, quando temos de derrotar vários inimigos ao mesmo tempo, mas os controlos medíocres e a câmara não ajudam a entregar uma boa experiência, atrapalhando mais do que é esperado. A dada altura deixamos de controlar apenas Rei e, juntamente com outras personagens, temos uma equipa onde podemos alternar quem controlamos, mas pouco muda pois estamos apenas a trocar com quem jogamos e o resto da equipa não aparece. Num ambiente que constantemente me lembrava de JoJo ou Persona, temos um conjunto de entidades cujos nomes são filosóficos (não esperaria o contrário) que se manifestam em combate. Algo que podia ser melhor explorado, mas ainda assim, dão um toque extra.

Com isto não quero dizer que não há progressão na jogabilidade. Ela existe e à medida que derrotamos Revenants, monstros especiais outrora humanos que ao serem derrotados nos deixam com Torments, as suas últimas memórias enquanto vivos, que depois podemos transformar em Sentiments, diga-se, itens que podemos equipar ou até mesmo fundir para melhorar o seu uso. O modo como tudo isto é feito encaixa no espírito emo ou melodramático que alimenta Crystar: para poder usar estes itens Rei tem de chorar no seu quarto, purificando-os para os tornar usáveis.

 

Se a estética não vos afastam, Crystar é um jogo interessante. Simples, por vezes até mesmo básico, mas nem todos os RPGs de ação precisam de ser complexos, sendo este bastante acessível e com diferentes níveis de dificuldade a gosto. Podia ser mais refinado, com um sistema de combate mais interessante e até diversificado tanto a nível de cenários como missões, mas no fundo cumpre o que é expectável de um dungeon crawler.

Nota: Análise efetuada com base em código final do jogo para a Nintendo Switch, gentilmente cedido pela NIS America.

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