Metal Hellsinger
Análise por Gonçalo Martins, do Glitch Gamecast
Em Metal: Hellsinger encarnamos a personagem de uma entidade misteriosa, sem nome, que se faz acompanhar de uma caveira que, além de arma jogável, também é a narradora da história do jogo. Ambos embarcam numa épica viagem pelo inferno com o objectivo de destruir a Red Judge aka diabo e recuperar a sua voz divina.
Para isso têm que passar pelos vários domínios do inferno, deixando pelo caminho tudo o que aparece à frente, desde o mais simples dos lacaios até ao boss final de cada domínio. Tudo isto ao som e ritmo (ênfase no ritmo) do mais visceral e intenso heavy-metal!
Já estamos todos a pensar em DOOM não é?!
Nem mais! Metal: Hellsinger é aquilo que seria o mais provável resultado de uma noite bem curtida entre DOOM e Guitar Hero. Um First Person Shooter onde seu combate, intenso, super fluido e inundado de adrenalina combina na perfeição com a omnipresente mecânica de ter que matar as criaturas do inferno ao som do ritmo das músicas Heavy Metal que vão tocando ao longo da demanda. Para isso contamos com um arsenal de armas, todas elas diferentes e todas elas com o seu próprio ritmo e cadência ao qual temos de nos rapidamente ambientar pois fora do ritmo musical damos muito menos dano aos inimigos e mais importante ainda, a música vai perdendo camadas e intensidade.
A história, provavelmente um dos pontos mais fracos, entrega uma narrativa simples e direta, montada em cima de uma origem vaga onde certos pormenores ficam de fora na tentativa de oferecer ao jogador aquela sensação de mistério em relação às personagens. Consequentemente os motivos que dão início a toda esta aventura também ficam perdidos na penumbra e as sequências entre missões dão apenas algum contexto que na minha opinião não são muito apelativas no que toca ao estilo visual utilizado. Fica a impressão de que o estúdio The Outsiders quis dar total prioridade à jogabilidade e pecou por escasso na idealização e concepção da história. Na realidade serão poucas as pessoas irão jogar este jogo procurando uma história intrigante e profunda.
Cumpre os serviços mínimos, encaminha o jogador com relativo sucesso e pouco mais.
Onde Metal: Hellsinger assenta as suas fundações e faz delas a sua essência é nos seguintes aspectos: jogabilidade, mescla de mecânicas e banda sonora.
Uma jogabilidade frenética, movimentos rápidos, a capacidade de navegar pelo caos das arenas utilizando os típicos dash e double jump, somando a isso tudo as armas que temos à disposição, embora não sejam em número elevado, são diversas o suficiente para sentirmos que temos escolha no início de cada capítulo sobre como queremos abordar o mesmo.
Curiosamente é num aspecto muito particular que o jogo tem o seu primeiro percalço, a inteligência artificial de uma boa parte dos inimigos. Muitas vezes algo estáticos, contemplativos e de certa maneira cientes de que estão ali a servir apenas de carne para canhão. Algo que é notório (menos obviamente!) até mesmo no mais difícil dos 3 níveis de dificuldade que o jogo apresenta.
Deduzo que esta parca presença em termos de inteligência artificial exista numa forma proposital para não acrescentar dificuldade desnecessária ao jogador pois o mesmo já tem a seu cargo uma mecânica rítmica que é intrínseca ao jogo independentemente da sua dificuldade.
De salutar são as batalhas finais de cada domínio que levam o jogo para um patamar mais semelhante a um jogo bullet hell que acrescenta aquele desafio muito próprio dos jogos desse estilo. Todos os bosses finais são semelhantes em termos de representação visual e em termos de lore até tem alguma razão de ser, onde divergem é nas mecânicas e no design das arenas que aqui e ali têm algumas surpresas para o jogador.
Ao acabar cada missão abrimos novos desafios que podemos concluir de forma a adicionar ajudas e aumentar as nossas habilidades.
A incorporação de mecânica rítmica neste FPS acrescenta diversão, desafio e mete a adrenalina a trabalhar no corpo.
Não é a primeira vez que um videojogo tem este tipo de mecânica, BPM - Bullets per Minute saiu há um par de anos e é um jogo onde tudo tem de ser feito ritmicamente e até tem no seu núcleo um contexto visual e sonoro semelhante. Este Metal: Hellsinger replica a maior parte dessas mecânicas e até é mais perdulário que o antecessor espiritual em algumas.
O jogo conta com uma ajuda visual na mira da arma em forma de setas que auxilia a acompanhar o ritmo da música bem como apontamentos visuais no cenário que se destacam tais como tochas e caldeirões que formam labaredas de fogo que são libertadas em linha com o que se está a passar a nível de banda sonora. Confesso que apesar de todos estes indicadores existentes no jogo acabei por recorrer ao mais básico dos instintos; bater o pézinho no chão e, obviamente e como não poderia deixar de ser, timidamente (ou não!) tirar o caruncho ao pescoço com um vigoroso headbang aqui e ali (ok… quase o jogo todo!). Não, não foi necessário nenhum tipo de fisioterapia após conclusão do jogo. O jogo é curto, dura 3, 4 horas e não dá tempo para causar dores de pescoço.
O que mais impressiona nesta questão de seguir o ritmo da batida da música é que para obtermos total satisfação em Metal: Hellsinger o jogo quase nos “obriga” a entrar num certo flow e assim que o ritmo acerta, o caos que reina nas várias arenas de combate quase se torna previsível, começamos a ver o nosso multiplicador a aumentar, a ganhar mais pontos, as armas dão mais dano e a música começa a ganhar cada vez mais camadas e volume. É esse, não só o verdadeiro “end game do jogo”, mas também a porta de entrada para a potencial longevidade que o jogo contém dentro dele. Munido de um sistema de ranking online, todas as pontuações que possamos alcançar após cada nível vão automaticamente para essa tabela criando assim competitividade para que possamos voltar e arranjar rotas mais rápidas, tentar descortinar os spawn points e as melhores armas para um determinado nível.
Aquele multiplicador tem de estar sempre a "x16" minha gente! Se o conseguirmos, estamos no olimpo do metal!
A cola que junta esta panóplia de mecânicas no jogo é a sua banda sonora. A equipa de The Outsiders chamou a si o talento do estúdio Two Feathers que é especializado em música e efeitos sonoros para videojogos que por sua vez criou todo um álbum de Heavy-Metal em volta de Metal: Hellsinger convidando vários artistas do gênero a participar. Nomes como Randy Blythe (Lamb Of God), Tatiana Shmayluk (Jinjer), Matt Heafy (Trivium), Alissa White-Gluz (Arch Enemy) ou Serj Tankian (System of a Down) elevam a performance e dão nome ao que certamente será uma das bandas sonoras do ano na indústria.
Fiquei surpreso ao saber que este álbum (até à data desta review) ainda não consta, nem em formato físico, nem nos serviços de streaming do costume, no entanto podem escutar as músicas dentro do jogo pois o próprio contém um leitor com a playlist inteira para deleite dos mais acérrimos fãs de Metal.
E quem não gosta de Metal?! Têm de jogar o jogo sem som?! Até ver sim mas o estúdio já fez saber que brevemente, na versão PC, irá adicionar uma nova funcionalidade a que deu nome de Music Modding onde possibilita o adicionar da nossa própria música e utilizá-la durante o jogo. Excelente ideia mas duvido muito que dê o grande prazer estraçalhar demônios a ouvir Dua Lipa ou Camila Cabello… ou então sim.
Metal: Hellsinger é uma excelente adição para este 2022, já ele repleto de bons videojogos.
O estúdio The Outriders acerta em cheio na forma como transpõe o equilíbrio necessário ao juntar todas as suas mecânicas num jogo frenético e com uma banda sonora poderosa a acompanhar. Um pouco de mais atenção na narrativa e mais variedade visual e mecânica nos bosses finais e experimentar algo em ambiente multiplayer ou co-op são as lições a tirar para uma próxima iteração desta saga. A base está criada.
Metal: Hellsinger está disponível desde 15 de setembro de 2022 para Windows PC, Xbox One, Xbox Series X/S e PlayStation 5.