Shenmue III
Quase duas décadas depois, eis que Shenmue 3 vê a luz do dia. Também tivemos um trailer do novo Half-Life e o remake do Final Fantasy VII sai já para o ano. Vivemos em tempos curiosos…
Tenho a dizer aqui, que nunca joguei um Shenmue. Conheço a fama, a fome, mas por ser uma série sem término, não quis arriscar para gostar e ficar a desesperar. Achei que não era a melhor pessoa para esta análise porque ia entrar a seco, mas pensando bem, até era a pessoa ideal para esta análise! O futuro da série não depende só dos fãs antigos, mas dos novos que estão a conhecer e a financiar os jogos. Daí a colecção dos anteriores terem saído na nova geração. E se não jogaram, como eu, podem ver o vídeo de resumo que o jogo oferece para estarem a par do que aconteceu até esta terceira entrada.
Bem, e quase duas décadas depois, os fãs têm a conclusão que tanto esperaram! Só que não. Shenmue 3 não se trata do capítulo final, mas de um filler central para desenvolver a narrativa que ainda está na cabeça de Yu Suzuki. A ser verdade, tenho em crer que falta mais dois jogos, mas não estou confiante. Não estou confiante porque jogos presos em "development hell" tendem a sair com uma qualidade dúbia, assim só para despachar ou para calarem as vozes da fandom. Este Shenmue 3 não é uma excepção.
Já tive o prazer de analisar jogos saídos de campanhas de Kickstarter com menos orçamento ou publicidade, mas com melhor qualidade e empenho. Por exemplo, o Kingdom Come: Deliverance. Não há desculpa. Shenmue é um jogo aclamado pela fama e pelos fãs, foi uma das campanhas do Kickstarter mais bem sucedidas, mas as polémicas foram ainda maiores. Desde parcerias duvidosas, às edições enviadas que ficaram aquém do anunciado. O que também ficou aquém foi a qualidade final e isso íamos vendo a cada trailer saído. Vai melhorar até sair! Vai ser refinado e optimizado. Nada. O que aconteceu, foi que o jogo saiu quase pela calada numa altura em que todos falavam do Death Stranding e com embargos, no mínimo, estranhos. Onde há fumo, há fogo.
Comecemos pela história: nesta terceira parte chegamos à aldeia de Bailu, onde acompanhamos o Ryu e Shenhua em busca do pai desta. Ao mesmo tempo, um grupo anda a incomodar os pedreiros locais e acaba por raptar um, Xu.
Ao tentar desvendar este caso, Ryu também acaba por descobrir uma ligação entre o seu pai, o pai de Lan Di e esta aldeia. E assim desenrola-se um jogo de artes marciais com toques de detective, onde o prato do dia é esgotar diálogos, espancar tolos e cortar lenha.
Ah, pois é. Não seria um Shenmue se não tivesse tempo para perder ou muito para coleccionar. Infelizmente, devido à falta de algumas parecerias originais, ao bonecos e os jogos tiveram de tomar alguma liberdade criativa. As actividades do dia a dia também regressam. No fundo, este jogo é UM Shenmue com tudo o que tem de bom e de mau. O mau é que não é um jogo de 2019. E tem de ser dito.
Este terceiro capítulo não é mais do que um Shenmue 2.5 desde os controlos rígidos aos visuais datados, sem esquecer a má dobragem inglesa e respectiva sincronização. OK, OK, até tem a sua piada se virmos o jogo como um filme de artes marciais dos anos 80, com aquelas dobragens que destoavam.
Mas não vou dizer que os gráficos eram maus porque houve momentos em que fiquei a admirar o cenário ou a reparar no estilo escolhido, com aquelas caras estranhas e mal esculpidas que me fizeram lembrar animes antigos, por exemplo. Assim a puxar para a caricatura e não para uma representação real do ser humano. Embora os controlos respondessem bem, houve uma sensação de controlos tanque de jogos da época. Os eventos QTE não perdoavam, mas ainda bem que optei pela dificuldade mais acessível para ver a história. Para aqueles ferrenhos, têm várias opções de dificuldade para se frustrarem.
Posso não ter jogado Shenmue no seu tempo, mas joguei todos os Yakuza numerados quando saíram na PS2 e PS3, assim como os Kiwami. Planeio avançar para os remaster e Judgment já em 2020, portanto dá-me uma pena que a série que originou uma das minhas séries favoritas seja tratada desta maneira. O afastamento da SEGA também não ajudou e quase de certeza de que teríamos outro jogo se fosse feito com o mesmo cuidado que Yakuza. Isto porque falta-lhe a vida, as personagens memoráveis, a história épica e focada e a qualidade daquele conteúdo adicional para perdermos horas sem fim à vista. Posso até estar a exagerar pelo amor que tenho a Yakuza, mas não deixo de pensar no Ses de um Shenmue feito para as novas gerações porque este não o é.
No fundo, é uma questão de mentalidade: assim que virei o interruptor mental para os anos 2000, decidi que o Shenmue 3 nem era mau, mas competente. Um Satisfaz num teste do Liceu. Existe e só não cairá no esquecimento porque os fãs não vão deixar. Acredito piamente que se voltar ao Kickstarter, irá ser financiado para ontem.
Como não fã da série, mas de outras, espero sinceramente que o senhor acabe a saga e dê a conclusão que os fãs tanto querem e precisam. Eu até acho que ele queira acabar porque também merece ver a sua obra terminada. Claro, e que seja boa!
Nota: Análise efetuada com base em código final do jogo para PlayStation 4, gentilmente cedido pela Ecoplay.