Shadow of the Tomb Raider


Cinco anos depois do enorme "reboot" da série Tomb Raider, a trilogia focada na origem da mais famosa heroína do mundo dos vídeojogos chega ao fim em Shadow of the Tomb Raider. Desta vez, com uma história mais sombria, focada no lado negro deste tipo de "arqueologia" - há coisas em que não se deveria mexer. Mas será esta uma conclusão satisfatória para uma saga que fez Lara Croft passar pelo mais variado tipo de provações?

Falando apenas da trilogia em questão, Tomb Raider estabeleceu-se como um jogo de sobrevivência com uma forte componente de plataformas e um cheirinho a puzzles, sendo a maioria deles opcionais. Rise of the Tomb Raider endereçou alguns dos problemas apontados pelos fãs sem arriscar muito na fórmula já estabelecida, pelo que seria interessante ver que riscos a Crystal Dynamics estaria disposta a correr para apresentar esta conclusão que se prometia mais sombria. Há um eclipse do Sol e tudo! Infelizmente, não foram muitos.


O contexto é tudo e, por isso, há que relembrar que o primeiro destes três jogos surgiu como um esforço de revitalizar a saga depois do enorme sucesso dos jogos Uncharted, da Naughty Dog. Uncharted foi buscar imenso à saga original de Tomb Raider, mas ao segundo jogo da série, em 2009, já estava a redefinir o conceito de "blockbuster" em formato videojogo. A história começava com Nathan Drake num comboio, imediatamente após um acidente, do qual terá de escapar antes que vá por um precipício abaixo. Logo a seguir, porém, o jogo recuava no tempo para mostrar tudo o que aconteceu antes, criando uma antecipação fantástica para se chegar finalmente ao comboio.

Neste Shadow of the Tomb Raider, a Crystal Dynamics também decidiu experimentar o "in media res". A história começa com Lara num aeroplano, imediatamente antes de se despenhar algures no Peru. Ecrã preto. "3 dias antes". Estamos no México, em perseguição da organização vilã Trinity, onde Lara consegue obter um artefacto precioso da cultura Maia. Problema? Retirá-lo deu início a uma série de 4 grandes calamidades, a primeira onde ela se encontra e as restantes no Peru. Então lá vai a protagonista apanhar o avião em direção ao acidente que já se tinha visto. O que ganhou a narrativa com esta técnica? Zero. O acidente foi causado por uma das quatro calamidades, mas não fez qualquer diferença a ordem como a história foi contada.


O problema com o argumento nem é por não começar de forma brilhante, é mesmo nunca chega a sê-lo. Experimenta-se com "in media res" e com "flashbacks" sem que tragam nada de muito relevante, apresentam-se personagens que podem ou não chegar ao final da história mas nunca chegam a desenvolver empatia necessária para que o jogador se preocupe com elas. Brinca-se com a ideia de que a Lara é que fez algo de errado, mas nem isso leva a narrativa a lugares interessantes. Ideias com potencial, cosidas como uma manta de retalhos, resultaram numa história que até se vê, mas rapidamente se esquece. Assim se chega ao final da "origin story" da mais famosa "tomb raider": conhecendo o seu passado, mas sem descobrir o que afinal a levará depois a seguir essa profissão.

Então e o jogo? As mecânicas de sobrevivência e exploração dos jogos anteriores continuam presentes, mas a experiência é a menos interessante dos três. Em geral, este é um título extremamente linear com algumas secções mais amplas que permitem exploração livre. As fogueiras / acampamentos continuam a ser o local de descanso onde Lara poderá fazer upgrades e servem como localização para "fast travel", o que permite facilmente voltar a secções antigas e explorar em busca de tesouros deixados para trás, mas na realidade o jogo nunca é sobre isso.

Caçar para sobreviver, colecionar artefactos para obter uma recompensa ou simplesmente explorar o mundo parecem apenas sobras do game design pensado para o primeiro jogo. O ritmo do jogo é razoável, com uma boa cadência entre sequências de tiros e plataformas, com bastante história pelo meio. Os puzzles continuam a ser poucos, mas estão mais presentes do que nos jogos anteriores. Ir sempre em frente permite tirar partido de quase tudo o que há de bom no jogo, com exceção das "challenge tombs", que é onde a maioria dos puzzles do jogo se encontram escondidas.


Não há muito a dizer sobre a jogabilidade em si, que está óptima, mas sim acerca da acessibilidade. Os criadores do jogo tiveram a sensibilidade de adaptar o jogo aos gostos de cada jogador, permitindo definir a dificuldade em termos de combate, exploração e puzzles. Alguns quererão combate desafiante sem terem de se preocupar com puzzles, outros o contrário, aqui está algo muito bem conseguido. A nível de exploração é o mais interessante, pois permite esconder as marcas de tinta branca que vão mostrando sempre o caminho a seguir, tornando assim os cenários visualmente mais realistas.

Já a nível gráfico, o jogo tem altos e baixos. Jogado numa PlayStation 4 standard, as ventoinhas da consola nunca tiveram de se esforçar tanto e, mesmo assim, em certos segmentos de "mundo aberto" o frame rate caiu consideravelmente. Os gráficos são muito bons e em certos momentos os cenários conseguem ser mesmo impressionantes, mas há uma discrepância bastante visível entre os gráficos do jogo e as sequências cinemáticas, algo que nos dias que correm não parece fazer muito sentido.


Shadow of the Tomb Raider é um jogo bom, mas que está longe de corresponder às ambições dos seus criadores. Vive na sombra de outra série, tentando aproximar-se do trabalho da Naughty Dog, em vez de tentar desbravar o seu próprio caminho por territórios inexplorados. O resultado é uma experiência menor que a soma das suas partes, com uma narrativa que pedia uma escrita mais cuidada e subtil.
Nota: esta análise foi efetuada com base em código final do jogo para a PlayStation 4, gentilmente cedido pela Ecoplay.

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