Kunitsu-Gami: Path of the Goddess


Há pouco tempo assistia a uma chamada à realidade conjunta que a PlayStation 2 estava a ser considerada uma consola retro. Incrédulo, pois parece que foi ontem que a tive, fui ver anos de lançamento e, efetivamente, já passaram 24 anos desde o seu lançamento… o que a torna retro. A passagem do tempo é cruel, afinal.


Independentemente do que lhe chamamos, foi uma consola incrível que viu o aparecimento de tantos jogos, tantas séries, ideias completamente originais que ainda hoje são exploradas. Uma das companhias cujos jogos mais venerava na altura foi a Capcom, que, ao mesmo tempo que evoluía o que tinha criado na geração anterior, trazia coisas novas e diferentes como Devil May Cry, Monster Hunter, o icónico Okami e até mesmo Viewtiful Joe. Arriscava (regra geral com muito sucesso) e deixava-nos com vontade por ver o que trariam de novo.

Viagem ao passado feita, é neste espírito da Capcom dos anos 2000 que recebemos agora Kunitsu-Gami: Path of the Goddess, um jogo bem diferente ao que têm lançado nos últimos anos, apostando numa nova Propriedade Intelectual que vai buscar inspirações a jogos do seu passado. Quando apresentado pela primeira vez pensei que estava a ver um novo jogo de ação ao estilo Onimusha com a arte e mitologia de Okami, duas séries que parecem esquecidas. Em parte estava certo, no entanto, após embrulhar-me neste novo jogo senti que a parte de jogo de ação é, na realidade, algo secundário.


Este é um jogo ao estilo tower defense, ou seja: do início ao fim do jogo temos uma sucessão de níveis onde temos de defender algo (ou alguém) dos imensos inimigos que vão aparecendo. Assim por dizer a “torre” que defendemos é a jovem Sacerdotisa Yoshiro capaz de purificar o mundo da maculação que o assombra, onde demónios (de nome Coléricos) corrompem pessoas e animais da belíssima Montanha Kafuku que temos de proteger. A história é simples, muito simples até, cumprindo na perfeição a visão deste jogo de estratégia onde o fundamental é percorrer os níveis todos por ordem.

A parte de jogo de ação surge ao controlar Soh, o protagonista e principal protetor de Yoshiro, que empunhando a sua espada enfrenta os vários demónios que nos tentam destruir. É uma tarefa árdua, mas, à nossa disposição, temos um conjunto de ferramentas para nos apoiar no combate como soldados que podemos recrutar, armadilhas e proteções que podemos erguer no cenário, entre todo um conjunto de melhorias que podemos aplicar aos soldados que nos apoiam, e não só.


Ao enfrentar os diversos bosses, em combates especiais numa arena própria, adquirimos uma máscara que nos desbloqueia um novo tipo de soldado. São fortes guerreiros, arqueiros que atacam à distância, feiticeiros capazes de erguer defesas, monges que nos defendem, ladrões que durante o dia procuram por espólios perdidos, mas à noite escondem-se do perigo. Dou aqui destaque à questão de dia e noite, a principal mecânica do jogo que passo a explicar de forma resumida. Durante o dia podemos avançar com Yoshiro para purificar o nível, resgatar pessoas e animais que estão maculados pelas trevas, preparar armadilhas, defesas e “transformar” os civis que resgatamos em soldados, para nos acompanhar no combate.

Contudo, é durante a noite que a ação acontece: os demónios invadem através dos portões que ainda não foram selados e tentam chegar a Yoshiro que, se conseguirem, é game over. Ela acaba por ser a principal personagem do jogo, caso Soh perca a sua vida torna-se num pequeno “fantasma” e vaguear pelo cenário, bastando apenas alguns segundos para voltar à ação e continuar a proteger a Sacerdotisa. Uma das missões, por exemplo, controlamos Soh apenas na sua forma de alma, recorrendo apenas às restantes mecânicas (e algumas especiais dessa missão) para conseguir concluir o nível, funcionando tudo extremamente bem apesar da situação.


Na prática, o jogo é repetir este ciclo dia e noite constantemente, enfrentar alguns bosses pelo caminho e continuar a peregrinação de Yoshiro para salvar a montanha. Além das melhorias que conseguimos dar aos soldados, também desbloqueamos um conjunto de mecânicas para Soh a determinado ponto, algo que honestamente bem podia estar mais próximo do início da aventura, pois não mudam drasticamente a jogabilidade, são apenas alguns truques adicionais que agradeço por causa de inimigos matreiros que nos apanham desprevenidos. E sinceramente até agradecia que estas melhorias estivessem disponíveis à mais tempo, pois ainda tive de fazer algum grind ligeiro para poder melhorar Soh e, ainda, os soldados que desbloqueamos.

Das coisas que mais me cativaram no jogo foi a estética, com raízes profundas no folclore oriental. O estilo artístico é muito bem explorado através da sua mitologia, tudo roda à volta de máscaras que são as responsáveis por transformar simples civis em soldados. É um tema bem explorado, coerente e encaixa na perfeição na história do jogo, pensado de igual modo como muitos outros clássicos da Capcom como os que já apresentei. Juntamente com os visuais há uma banda sonora que, mesmo longe de ser memorável, cumpre na perfeição o seu objetivo. O ponto mais curioso é talvez o voice-acting, ou melhor, a quase ausência do mesmo, tendo muito poucas falas no jogo o que acaba por dar um sentimento meio que retro.


Algo que é secundário, mas que me divertiu imenso apesar de tudo, é que à medida que salvamos a montanha e selamos os portões demoníacos, vamos poder restaurar as várias vilas, florestas e cavernas por onde passamos. Para tal atribuímos recursos e mão de obra que vamos adquirindo, de modo a restaurar a montanha em toda a sua glória. Honestamente, à falta de um grande objetivo além de proteger Yoshiro enquanto salvamos tudo e todos, foi esta mecânica de construção que me motivou para continuar jogo fora, tentando restaurar todos os cenários na sua totalidade. Não quero dizer que o jogo tivesse falta de objetivos, muito pelo contrário e a cada nova missão eram novos os monstros que surgiam, com feitios muito próprios onde tinha de explorar as melhores estratégias para os enfrentar.

Estas novidades constantes durante o jogo entreteve-me, nunca tinha um grupo de soldados fixos e ia sempre variando, de modo a lidar com diferentes tipos de criaturas e perigos. Não que tenha sentido grandes dificuldades, fora uma ou outra missão que tive de repetir anteriores de modo a poder melhorar Soh e os soldados, mas acima de tudo foi uma experiência bastante tranquila. É um jogo de estratégia tower defense puro e, apesar de tanta coisa, mantém-se bastante simples do início ao fim.


O meu tempo com Kunitsu-Gami: Path of the Goddess foi bom, bastante bom até, levou-me duas décadas atrás no tempo ao espírito de uma Capcom de então, trazendo consigo muita nostalgia. Não sei se será um jogo que vou repetir, penso que não há muito mais que ele me possa oferecer de novo, mas é um jogo que recomendo vivamente aos fãs de jogos de estratégia e, de forma geral, aos fãs da Capcom!


Nota: Análise efetuada com base em código final do jogo para a PlayStation 5, gentilmente cedido pela Ecoplay.

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