Suikoden HD Remaster Gate Rune War
Com o extenso nome Suikoden HD Remaster I&II Gate Rune & Dunan Unification Wars, são remasters dos dois primeiros títulos, lançados para a PlayStation em 1995 e 1998 respetivamente. Dois lançamentos que chegariam à Europa alguns anos depois face ao Japão, que me tornaram fã logo no primeiro jogo e que, depois, não perdia um único lançamento cá. São jogos que tenho muito a contar, mesmo sendo dois RPGs bastante simples e ótimos para introduzir as pessoas a mais uma série do género, que podia colocar tudo numa única análise, mas… porque não dar o devido destaque a cada capítulo?
Sem mais demoras, eis Suikoden HD Remaster Gate Rune War!
Nesta introdução e estreia da série seguimos a aventura de Tir McDohl, um herói que irá salvar toda uma região do mundo das garras do impiedoso império do Scarlet Moon Empire e do seu imperador, Barbarossa. Somos introduzidos ao jogo como mais um soldado neste império, filho de um dos grandes generais em que ficamos responsáveis por tarefas meio que irrelevantes, que nos levam a explorar um pouco do mundo. Não são precisas muitas horas de jogo para perceber que estamos perantes um império corrupto cheio de gente sem escrúpulos, onde logo no arranque da história somos incentivados, até mesmo forçados a mudar a nossa posição, tornando-nos rebeldes.
Quando damos por ela somos o líder de uma pequena rebelião que se opõe ao Scarlet Moon Empire, conseguimos uma base de operações e estamos prontos para explorar o mapa, recrutando aqueles que se aliam à nossa causa. Um dos grandes focos da série Suikoden é o recrutamento das 108 Stars of Destiny, um grupo de heróis que se juntam à nossa missão e trazem consigo aliados para combater o exército inimigo. É algo que também serviu de base para a criação de Eiyuden Chronicles, um jogo de sucesso kickstarter criado por muitos dos autores da série Suikoden, que fez bastante ruído e possa ter sido o impulso necessário para a Konami aperceber-se que há público para estes jogos. O que me deixou extremamente feliz!
Acompanhando esta história das Stars of Destiny temos a mitologia das runes onde há 27 principais, entre as muitas outras que servem para dar habilidades ou magias aos que as equipam. O nosso herói Tir torna-se o portador da Soul Eater, uma das 27 True Runes, capaz de ceifar facilmente a morte dos seus inimigos. Uma runa que tanto garante poder ao seu portador, dando-lhe imortalidade e um leque de ataques especiais para usar, como também se torna um fardo ou até mesmo uma maldição. Tanto as 108 Stars of Destiny como as 27 True Runes são pilares importantes para a série Suikoden, ligando-as todas ao nível narrativo e mitológico, sendo em parte um motivo para jogos como Suikoden Tierkreis serem aclamados de spin-offs por todos e não títulos da série principal, mesmo quando partilham mecânicas. É uma mitologia que aprecio imenso, com inspirações no romance chinês "Margem da Água", que relata as aventuras de 108 bandidos, um dos quatro grandes romances clássicos da literatura chinesa, aos quais também pertencem o "Romance dos Três Reinos" e a "Jornada ao Oeste"!
É um RPG à antiga, a aventura avança a um ritmo rápido sem grandes distrações pelo caminho, levando-nos a libertar toda a região do jogo das garras de Barbarossa. Há um leque muito, muito diverso de personagens de todas as raças e feitios, de elfos a cães antropomórficos, feiticeiros, soldados entre muitos outros guerreiros. Nem todas as personagens têm um papel ativo em combate, muitos são os que recrutamos para construir lojas na nossa base, desbloquear mecânicas e mini-jogos, sendo que há um incentivo especial para recrutar todos. Certo que já vinha com uma certa pré-disposição para o jogo, principalmente porque o conheço de uma ponta à outra, mas jogar um RPG bem mais tranquilo que não requer dezenas ou centenas de horas, calhou-me mesmo bem! Ainda por cima com personagens tão ricas como Gremio, sempre a nosso lado, ou outros como Cleo, Viktor e Flik que nos ajudam história fora. Nomes que a quem não conhece o jogo diz absolutamente nada, eu sei.
O combate é parte vital do jogo, como bom RPG dos anos 90. À disposição temos uma equipa de 6 membros, onde encontramos soldados que precisam de estar na linha da frente para poderem atacar enquanto que outros usam ataques mais fracos de longe, protegidos na retaguarda. Há o sistema de Unite que junta a força de duas ou mais personagens num ataque bem mais forte, ou até mesmo combinações de magias através das principais runes elementais (água, fogo, vento…), algo bem familiar para os fãs do clássico da Super Nintendo Chrono Trigger que, curiosamente, saiu no mesmo ano que Suikoden.
As runes trazem poderes especiais e magias para usar principalmente em combate, sendo que agora neste remaster é mais fácil perceber o que faz o quê através das descrições presentes no jogo, uma das melhorias presentes agora. Não é um jogo desafiante, de todo, não são precisas grandes estratégias para lidar com os bosses mesmo agora a jogar no modo de dificuldade em Hard que aumenta um pouco o desafio. Acompanhando estes combates, fruto geralmente de random battles, temos ainda os combates de exército onde colocamos todos os nossos soldados à prova, e combates corpo a corpo em duelos importantes para a história. São dois estilos de jogos diferentes adicionais, mas que se baseiam ambos num jogo de "pedra papel tesoura", onde temos um trio de opções mais fortes que outra, mas fracos contra a restante.
Embora simples, a história de Suikoden não se contém quando tem de ir por caminhos mais sérios, não poupa quando tem de matar alguém, seja por que lado for onde nós também podemos não ser inocentes. São várias as decisões no jogo que mudam um pouco o rumo da história, mesmo quando o final está pré-definido a conclusão está muito ligada às personagens que recrutamos pelo caminho. Também não conta com um típico vilão que é mau só porque sim, ou por que tem uma questão mitológica ou filosófica para querer destruir o mundo: este é um jogo principalmente político, as coisas não são tanto a preto e branco e há sempre o desejo constante de conquista, que temos de combater a todo o custo. Na altura foi uma autêntica novidade para mim, estava habituado a RPGs onde o vilão era apenas um mauzão que queria matar a todo o custo, onde pelo meio surgiam entidades divinas dignas de religiões. Aqui lidamos principalmente com humanos, as suas vontades e visões.
Toda a aventura é feita em redor de um gigante lago Toran que dá nome à região. A sua exploração é tranquila, linear e estamos constantemente a saltar de cidade em cidade e progredir na aventura, com os eventos a sucederem-se uns aos outros sem grandes intervalos entre eles. Tanto podemos estar a apoiar a cidade dos elfos num momento como, logo de seguida, partir para o lado oposto da região para enfrentar um general inimigo. Também a história não se estende, não tem grandes sequências narrativas ou até mesmo cutscenes para mostrar os eventos, algo bastante comum da altura quando muitas companhias haviam saído da Super Nintendo e começando a lançar os seus primeiros títulos na PlayStation. Não invalida que não hajam momentos na história marcantes, que nos marcam mesmo quando tudo é feito praticamente em diálogos, momentos estes que nos dão vontade em continuar com a história. É um jogo que mostra bem as suas raízes, a altura em que saiu e é algo bem preservado neste remaster.
Há umas quantas melhorias na remasterização de ambos os jogos, tornando-os mais acessíveis enquanto corrigem vários erros de tradução e localização, eliminando alguns bugs pelo caminho que ficaram nos jogos originais. Visualmente, Suikoden HD Remaster sofreu uma boa atualização sem fugir muito ao produto original em si, mantendo os visuais em 2D e tudo o que é sprites da versão original, onde as principais melhorias surgem nos vários efeitos especiais em combate ou coisas simples, como a água nos cenários. Os novos retratos das personagens dão uma nova vida às mesmas, detalhando-as muito melhor, respeitando as ilustrações originais, até porque foram buscar novamente Junko Kawano, artista responsável pela arte do jogo original, para fazer esta atualização dos retratos.
Foram criados novos efeitos sonoros, mas a banda sonora mantém-se inalterada, onde tudo contribuiu imenso para a minha nostalgia ainda bem viva destes primeiros dois jogos, fazendo-me sentir que estava a jogar os jogos originais. Curiosamente, há ainda elementos aproveitados ou feitos à imagem da versão SEGA Saturn do jogo, uma versão bem desconhecida que nunca chegou ao ocidente! Só é pena que o jogo não tenha nenhum modo de alternar entre os visuais originais e estes do remaster, que não tenho grandes queixas embora muitas vezes pareça demasiado "RPG Maker", sem tirar valor a esse motor de criação de jogos, mas os cenários principalmente estáticos merecia algum carinho adicional.
Temos outras coisas, os combates podem ser acelerados para o dobro ou triplo da velocidade, embora que isso torne a música mais rápida, o que é estranho. Um ponto que se junta a outras decisões que me deixaram confuso, como um sistema de inventário que não implementou as melhorias do segundo jogo, mesmo que seja mais fácil agora trocar de equipamento. Algo que me deixou mesmo perplexo foi, tendo-o jogado na Nintendo Switch o jogo corre a 30 frames por segundo, num jogo que é maioritariamente 2D… que não me faz muito sentido, a não ser que tenham ignorado por completo a otimização do jogo. Mesmo a jogar em modo portátil a resolução do jogo é estranha, não está pixel perfect como gostaria de o ver, coisas que não me arruínam de todo a experiência do jogo, embora gostaria de as ver bem afinadas.
Devo-o ter jogado mais de uma dezena de vezes e foi tão bom regressar agora como sempre, uma região novamente explorada de cara lavada e com maior velocidade, agora que podia correr e mover-me na diagonal, algo inexistente na versão original. Sei que sou chato, bem vocal constantemente a falar de Suikoden, mas sinto que é uma série que merece ser reconhecida e explorada, principalmente pelos fãs dos RPGs. Também é um título que recomendo como estreia no género, que muitas vezes afastam as pessoas por serem extensos, Suikoden HD Remaster Gate Rune War é uma aventura que completam entre 15 a 20 horas na sua totalidade que, talvez, queiram repetir caso na vossa primeira experiência com o jogo não tenha conseguido recrutar todas as 108 Stars of Destiny.
Foi um regresso recheado de nostalgia, o leque de personagens próximas de Tir McDohl continua tão precioso como sempre que, perante um exército tão vasto de personagens, há sempre um pequeno grupo que nos recebe sempre e até nos custa não os ter na equipa, mesmo quando surgem personagens potencialmente melhores. É também a primeira parte da coleção, "obrigatório" de jogar antes de partir para Suikoden II HD Remaster Dunan Unification War, jogo que vou agora a meio e falarei dele a seu tempo!