Split Fiction


Se há nome que tenho confiança é a Hazelight Studios. Muitas vezes falamos em jogos "feitos com o coração" que às vezes são só palavras chorudas que não se refletem no produto final, mas, tanto o estúdio como Josef Fares não têm falhado. Foi assim com Brothers e principalmente no It Takes Two e, não, não ignoro A Way Out, apenas esse fica um pouco àquem do restante catálogo que esta equipa trouxe. Com isto é normal ficarmos entusiasmados com o que a equipa trouxe agora com Split Fiction, mas… passo a palavra ao Gonçalo!

Ora bem! Este Split Fiction é incrível! Desde que acabei o jogo com o Nuno Mendes (graças ao regresso do famoso “Passe de amigo” que os jogos da Hazelight proporcionam) que tenho feito um esforço bastante considerável para me tentar lembrar de algum aspeto do jogo que não esteja para lá de perfeito. Não consigo!

Verdade que a história é um pouco isenta de complexidade (principalmente nas primeiras horas), mas visto que estamos a falar de um enredo que assenta em universos que duas escritoras amadoras e inexperientes construíram parece-me que até aí os desenvolvedores fizeram um excelente trabalho em representar isso mesmo no jogo. Mas não confundir simplicidade com simplismo, a história pode não ter grandes ramificações narrativas, mas a carga emocional fez-se sempre sentir do princípio ao fim e manteve-me sempre colado ao ecrã mesmo que o passo seguinte fosse sempre o esperado.

Esta simplicidade que referi é bem-vinda e dá espaço a uma criatividade sem limites que me fazem deduzir que Josef Fares anda a meter alguma coisa no café da malta que trabalha no Hazelight Studios e não é açúcar. Ele acordou de manhã e não escolheu violência, escolheu sim, fazer aquilo que lhe deu na real gana e sem pedir licença a ninguém.

Uma construção de mundo onde existem poucas regras, muita loucura e onde a alternância entre o mundo do sci-fi e da fantasia não só liga ambos os mundos de maneira irrepreensível mas também servem de limpa palato um para o outro.


Esses mundos são a representação máxima da criatividade das duas personagens principais de Split Fiction, Mio e Zoe. Mio é uma rapariga da grande cidade com um feito bastante ríspido e agressivo, típico de quem cria uma carapaça emocional que lhe vai permitindo resistir às agruras da vida e Zoe é uma rapariga do campo que possui uma personalidade muito sonhadora, mas que carrega consigo o peso de culpa e de lamento causado por um evento muito pessoal. O mundo sci-fi criado por Mio é cheio de ação, frenético e explosivo, onde podemos descobrir e saborear várias homenagens aos grandes clássicos do cinema e videojogos deste género enquanto que o mundo da Zoe é mais colorido, onde a natureza fantasiosa e as criaturas mitológicas assumem papel de grande destaque.

Falando em grandes destaques, o maior vai mesmo para a jogabilidade. Split Fiction é um poço sem fim de mecânicas de jogo e, obviamente, todas elas implicam uma coordenação total e absoluta entre os dois jogadores e isso torna a experiência por vezes desafiante, mas sempre divertida. Umas vezes apresenta "homages" a clássicos da indústria dos videojogos, outras inova ao ponto de deixar quase de boca aberta o mais incrédulo tal a criatividade apresentada. O típico "platforming" está sempre presente e sempre entrosado com uma construção de mundo exímia e criativa que por vezes transforma aquele universo numa autêntica caixinha de areia repleta de coisas para experimentarmos ou apreciarmos. Esta premissa é válida em qualquer momento do jogo inclusive durante a várias batalhas com bosses ou mini-bosses.


Joguei este jogo no PC e tinha exatamente zero ocorrências durante todas as 13 ou 14 horas que durou o jogo. Uma experiência visual e sonora igualmente ímpar que deita por terra a necessidade moderna quase doentia de forçar Raytracings e derivados para dar fidelidade visual a um jogo. Split Fiction não tem nada disso e é lindíssimo. Mais ainda! Split Fiction foi desenvolvido em Unreal Engine 5, uma "praga" que tem vindo a introduzir stuttering e outras maleitas nos videojogos mais recentes, mas a verdade é que aqui nada disso acontece e a malta agradece.

Split Fiction é grande candidato para GOTY este ano sem qualquer margem para dúvidas e os videojogos que ainda irão sair em 2025 terão que trazer muita, mas mesmo muita coisa para cima da mesa para o tirar desse trono. Divertido, emocionante e sempre com uma revigorante capacidade de surpreender quem o joga, Split Fiction passa com distinção na difícil tarefa de estar sempre a atirar coisas novas aos jogadores do princípio ao fim, fazendo com que não exista um minuto sequer de repetição e a sensação de descoberta esteja sempre presente. Quem diz presente é também o Nuno Mendes a quem eu passo a bola.


É verdade que esta análise foi feita numa espécie de dar seguimento ao jogo. Split Fiction é um título para ser jogado a dois, não há outra maneira possível de o jogar sem ser com outra pessoa, quer localmente ou através da magia da internet, usando o "Passe de amigo" como o Gonçalo bem referiu. Aliás, quando ele me disse para jogarmos o jogo para esta cobertura nem pensei duas vezes, até porque estava mortinho por meter as mãos no jogo. E atentem que isto de coordenar vidas de adultos nem sempre é fácil, mas… lá conseguimos, avançamos pela história até ao seu final, comentando constantemente aquilo que estávamos a ver.

Não quero repetir muito do que já foi dito aqui, que seria apenas fazer eco a muitos argumentos, mas, não consegui conter o meu fanboyismo perante muitas das referências que foram apresentadas no jogo. Quer dos videojogos, lembrando-me de clássicos que vêm desde os anos 90, até mesmo aos filmes e séries que me acompanham desde a infância, Split Fiction é um jogo que me preencheu bem e trouxe um bom quentinho enquanto o jogava. Certo que a história era previsível e conseguia prever o que iria acontecer depois, mas tanto pensava nisso como rapidamente me punham uma referência a jogos que adorei que acabava por ignorar completo se achava ou não previsível.

Porque, apesar de a adivinhar, a história não se conteve e atirou-me com momentos bem sentimentais que parece  terem-me tocado em todos os pontos fracos. São momentos que apelam forte à nostalgia, que me fizeram lembrar da minha infância e dos meus mundos imaginários que eu próprio criava desde muito novo. Outros momentos apelaram à saudade e ainda ao sentimento forte de perda que, infelizmente, toca a todos eventualmente e é aqui que entra muito o sentimento de terem feito um jogo com alma, ou carinho, pois conseguiu fazer tudo extremamente bem sem cair no exagero, no cliché ou um sentimentaloide barato.


Mesmo ao nível de jogabilidade, esta foi uma aventura que me entregou tudo o que eu aprecio como fã de jogos de plataformas. Não é desafiante nem esse é o objetivo do jogo, o que não significa que seja um jogo básico, muito pelo contrário! Com apenas um par de botões para ações distintas, o jogo sabe muito bem explorar diferentes mecânicas e, quando já dominamos uma dela, surge um twist à mesma para colocar à prova as nossas capacidades de reação. Muitas foram as mecânicas exploradas tanto nos cenários de Zoe como Mio, fantasia ou ficção científica, mas havia sempre algo diferente quando repetiam mecanismos de níveis passados.

Depois cada novo nível era uma aventura diferente, com mecânicas distintas e deixou-me excitado com o que seguiria porque quando pensava que já tinha visto tudo, o jogo surpreendia-me novamente! As últimas horas deste jogo tiveram dos melhores momentos que vi em videojogos nestes últimos anos, deixando-me a questionar como é que tinham conseguido tal feito com tanta facilidade, sem tornar o jogo numa salgalhada. E isto é um jogo polido ao mais pequeno detalhe, foi notório o quão otimizado estava ao nível de jogabilidade, porque até tempo tiveram para adicionar umas brincadeiras ou mini-jogos em vários níveis só porque sim, sem qualquer objetivo além de nos divertir-nos.


E é isto o que aprecio em muitos jogos, momentos que nos estampem um sorriso colado na cara porque nos diverte, ou motiva, que nos deixa agarrados ao comando e ecrã com vontade de ver o que se segue. Split Fiction é o resultado de uma fórmula mais que polida por parte da Hazelight e de Josef Fares, que só me deixa curioso por saber o que fazem a seguir. Seja um novo jogo feito especificamente para dois jogadores, ou algo totalmente diferente, venha a próxima aventura deles!



Split Fiction saiu no dia 6 de março de 2025 para PS5, Xbox Series X|S e PC.


Nota: Análise efetuada com base em código final do jogo para a PlayStation 5, gentilmente cedido pela Ecoplay.

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