Black Mirror: Bandersnatch
Ainda há não muito tempo, na nossa análise a Minecraft: Story Mode - Season Two para a Nintendo Switch, referíamos o facto da primeira temporada estar disponível no Netflix como uma experiência interativa. Algo que, pensando bem, faria muito sentido com a maioria dos títulos da Telltale e não só. Afinal, em videojogos deste género, o que realmente importa é a sua narrativa e a forma como as escolhas do jogador afectam a história, acabando por envolvê-lo naquilo que está a ver.
Não sendo propriamente uma novidade no entretenimento, pois já nos anos 90 o "Você Decide" da SIC permitia aos telespectadores votar no final de cada episódio, os dramas interativos estão agora acessíveis em múltiplas plataformas e formatos, o que os tem vindo a popularizar. Não é, por isso, de admirar que o Netflix queira explorar o conceito na sua plataforma de vídeo. A surpresa, porém, é que o tenha feito sob a insígnia da série Black Mirror.
Bandersnatch é inspirado num videojogo real com o mesmo nome, que se encontrava em desenvolvimento em 1984 quando a companhia faliu. É nesta época que se passa a narrativa do filme, onde o protagonista Stefan está a tentar criar um videojogo chamado Bandersnatch, inspirado num livro com o mesmo nome. O seu objetivo é muito ambicioso, desenvolver um videojogo com uma narrativa interativa, no qual as escolhas do jogador irão determinar os acontecimentos seguintes, tal como o livro em que se baseia. Sim, é um filme onde o espectador escolhe a sua narrativa, sobre desenvolver um videojogo onde o jogador escolhe a sua narrativa, baseado num livro onde o leitor escolhe a sua narrativa. Não fosse isto Black Mirror...
Para quem não conhece, Black Mirror é uma antologia de histórias sobre a relação das pessoas com a tecnologia, apresentadas em episódios independentes, embora hajam algumas referências entre eles, para os espectadores mais atentos. Na sua maioria, servem de mote para a reflexão sobre como a tecnologia pode ser utilizada tanto para o bem, como para o mal. Por exemplo, que mal poderia haver num sistema de redes sociais com pontuação do utilizador, semelhante à pontuação de motoristas da Uber? Muito, como se pode ver na série.
Em Bandersnatch, enquanto Stephan lida com as dificuldades de desenvolver um videojogo com tantas ramificações, descobre que o autor do livro em que o jogo se baseia acabou por sofrer de grandes problemas psiquiátricos. O esforço de pensar em todas as ramificações possíveis, todas as escolhas e consequências, parece ter desenvolvido efeitos nocivos na mente do criador, fazendo-lhe questionar as suas próprias escolhas na vida real.
Sem entrar em mais detalhes, e sendo isto Black Mirror, um filme interativo não poderia ser só uma história onde se decidem as escolhas do protagonista. Mais do que explorar as possibilidades de interação, o filme explora as expetativas do espectador, envolvendo-o no novelo da narrativa. Qual o impacto da escolha? Como teria sido escolher a outra opção? A partir de certo ponto, ao explorar múltiplos finais alternativos, a experiência torna-se absolutamente deliciosa, com escolhas que brincam com quem está a escolher. Sendo assim, haverá mesmo uma escolha?
No fim, fica uma reflexão em torno da interatividade, a liberdade de escolha e até mesmo a incessante busca por um final "perfeito", se é que tal é possível. Fica até mesmo a reflexão sobre o que seria realmente a história deste Bandersnatch.
Infelizmente, o visionamento deste tipo de experiências no Netflix ainda não está disponível em todas as plataformas onde se pode aceder ao serviço, estando por enquanto de fora dispositivos como o Chromecast ou a Apple TV, algo que provavelmente irá mudar no futuro, especialmente se o género se popularizar no Netflix. Nos restantes dipositivos, a interação será feita através do toque no ecrã, o rato do computador ou até mesmo o comando da TV no caso de ser uma SmartTV. Ainda assim, seja qual for o dispositivo escolhido, esta é realmente uma experiência bastante recomendável.