The Callisto Protocol


Em 2019 o criador de Dead Space, Glen Schofield, fundou um novo estúdio chamado Striking Distance. Na sua mente estava The Callisto Protocol, um survival horror que seria o sucessor espiritual da famosa franquia de tinha ajudado a criar na Visceral Games e que iria aproveitar ideias que não teriam sido bem exploradas nessa saga trazendo novos argumentos e explorando novos conceitos no género.

Em The Callisto Protocol somos Jacob Lee, um piloto mercantil que transportava mantimentos entre o planeta Europa e a prisão de Black Iron na lua Calisto. A sua nave é abordada por um grupo terrorista de seu nome Outer Way e são forçados a uma aterragem de emergência na superfície de Callisto onde é abordado pelos guardas da prisão e, por razões que só interessam a quem for jogar, é “convidado” a ficar preso nas suas instalações. Rapidamente se descobre que em Black Iron são feitas hediondas experiências em humanos que acabam por originar uma doença que infecta toda a prisão e transforma os seus prisioneiros em criaturas sedentas de carne viva.

A história apresentada é bastante simples e já a vimos repetida várias vezes em muitos jogos ou filmes. Jacob é o típico anti-herói. Parcialmente alheio a toda uma situação onde claramente não esperava encontrar-se e agora inevitavelmente tem de sair dela. Apesar de pouco inspiradora não será a história o principal motivo para querer jogar este jogo, no entanto um pouco mais de originalidade e complexidade não iriam fazer mal a ninguém nem que fosse para ajudar a criar uma ligação com as personagens. Algo que não acontece.

Algo que também não contribui nada neste aspeto em particular é a forma já demasiado batida em como ela nos vai sendo apresentada e contada ao longo do jogo. Vamos seguindo uma espécie de “caminho de migalhas” onde o lore é propositadamente posto aqui e ali e que é feito através do aparecimento de hologramas em que várias personagens nos vão contando os porquês do que está a acontecer à nossa volta. É certo que temos algumas cutscenes onde realmente vemos a interação entre as personagens e temos hipótese de ver em ação o leque de atores que foram contratados tais como Josh Duhamel (Transformers, Bandit) ou Karen Fukuhara (The Boys, Suicide Squad) mas na maior parte do tempo a informação é passada quase ao ritmo do aparecimento dos checkpoints o que torna tudo muito seccionado e pouco orgânico.

Se a história do jogo é prato com pouco sal, é na sua jogabilidade que as coisas ficam com outro sabor mais intenso e não necessariamente para melhor. Mas antes de falar especificamente do combate quero dedicar umas palavras à maneira como a Striking Distance nos obriga a ir avançando ao longo das várias missões. Perdi a conta aos fusíveis que tive de trocar para meter portas a funcionar, aos interruptores que tive de ligar para dar energia a sistemas e aos túneis de ventilação pelos quais tive que rastejar para contornar caminhos ou acessos que precisamente não tinham nem fusíveis para substituir ou interruptores para ligar. É literalmente um “copiar/colar” disto ao longo de todo o jogo que esmorece muito a experiência. Talvez mudando uma lâmpada ou reparando uma tomada de vez em quando quebraria a monotonia deste tão inesperado trabalho de eletricista.

Algo que contrariou toda esta sensação de repetição foi a completa falta de direções que neste caso é bem vinda. Tirando a sinalização que faz parte dos corredores e salas onde se desenrola a história, o jogo não encaminha o jogador para nenhum lado. Certo que a progressão é maioritariamente linear, no entanto, existem sempre caminhos alternativos que dão a salas secretas e proporcionam um desafio extra mesmo a quem não está a contar fazer grande exploração.

Já diz o povo “Quem se mete em atalhos, mete-se em trabalhos” e este jogo não é exceção. Por norma estes caminhos alternativos possuem mais oportunidades de combate mas também mais recompensas.


Passemos então ao combate e confesso que era neste ponto que eu achava que iria estar a maior valência deste jogo. Ao princípio achei que sim, depois senti-me enganado.

O jogo assenta principalmente na proximidade com os nossos inimigos. O campo de visão é super estreito, ao início e até mais de meio do jogo a escassez de munições incita ao combate corpo a corpo, a própria natureza gore do jogo sugere também que inevitavelmente tenhamos que sujar as mãos e o arsenal bélico que vamos ganhando à medida que progredimos na sua maioria é também ele para combate mais próximo (bastão, pistola, várias caçadeiras, etc.).

O combate em The Callisto Protocol é o verdadeiro toma lá, dá cá. Ora bato eu, ora bates tu, podemos usar e abusar da mecânica de desviar para a esquerda ou para a direita, defender golpes, contra atacar, fazer combos com as armas que temos e assim que caem mortos no chão ainda podemos dar-lhes uma sapatada para confirmar que ficam mesmo no chão (Olá Dead Space!). E isto tudo funciona mais ou menos bem quando só existe uma criatura para esfarelar à nossa frente (tendo fé que o jogo regista como deve ser os nossos movimentos, o que nem sempre acontece). A partir do momento em que se juntam duas, três, quatro ou cinco criaturas na sala onde estamos, o jogo adiciona um perk no jogador que se chama frustração e fica connosco até ao final.

O auto-lock não sabe para onde se virar, as animações são tão lentas que o jogo por vezes nem regista ações mais rápidas, se nos desviamos de um inimigo o outro que está ao lado trata do resto sem sequer dar hipótese de respirar, a animação de curar demora três horas de meia a acontecer tornando-se impossível de usar durante as lutas, para usar os nossos poderes cinéticos é bom que nada esteja no caminho senão a ação é logo cancelada e o laçarote que aconchega este embrulho todo é o já referido minúsculo campo de visão. Basta estarem 2 inimigos à nossa frente que deixamos de ter noção do que está à nossa volta e parece que estamos todos apertadinhos dentro de um elevador que avariou esperando que apareça alguém para o arranjar. Provavelmente resolve-se trocando um fusível visto ser essa a temática recorrente.

É sem dúvida alguma o elemento mais frustrante deste jogo, não pela dificuldade que o jogo apresenta mas sim pela falta de capacidade operacional das ferramentas que o mesmo nos oferece para ultrapassar essas dificuldades.

Sinto que estou há vários minutos a mandar sapatadas num monstro que já caiu morto no chão apenas e só para aliviar stress. Vamos falar de coisas boas?


Os gráficos deste jogo são de outro mundo, enchem o olho e dá prazer progredir na história apenas e só para admirar todo o trabalho fantástico feito a nível visual. Uma construção detalhada de um mundo e uma atmosfera que se quer sombria e que nos incute aquele nervoso miudinho ao passar pelos muitos corredores e salas da prisão. Algo que está igualmente fenomenal são os modelos das personagens principalmente durante as cutscenes (que pecam por defeito diga-se) e onde o nível de detalhe a nível de texturas é do melhor que vi num videojogo até à data e onde pela primeira vez nesta geração posso dizer que estamos a experienciar verdadeiramente gráficos "next-gen".

De referir que analisei este jogo numa PS5, plataforma essa que até à data do lançamento desta review é a única que consegue correr o jogo sem qualquer tipo de quebras ou problemas de maior. O jogo corre a uns constantes 30fps em modo de qualidade sem qualquer tipo de problemas.

Segundo várias noticias, quer na Xbox X/S, quer no PC, as versões estão longe do ideal principalmente a nível de quebra de framerate e falta de otimização principalmente no que toca ao uso de ray tracing. 
Parece que o trabalho que os mais de 150 funcionários que a Sony cedeu para ajudar no processo de desenvolvimento deste jogo foi frutífero...


Com uma oportunidade única de surfar a onda de um gênero que está a voltar a ficar na moda na indústria dos videojogos, The Callisto Protocol deixa-se cair no lugar comum em  muitos aspetos e falhar redondamente em outros tantos; uma história super linear e previsível com uma progressão simples e de esforço reduzido, falta de otimização mecânica e polimento principalmente em áreas que iriam beneficiar a qualidade de vida do jogador e um sistema de combate que sofre muito e faz sofrer muito.

Apesar de apresentar gráficos de última geração, um ambiente de cortar a respiração e uma panóplia de atores de renome, não aproveita todo o seu potencial e fica longe de onde foi beber toda a sua inspiração ou sequer de ser uma versão melhorada da mesma. Em última análise este jogo serve para nos lembrar a todos (mais uma vez!) de que grandes gráficos não significam necessariamente grandes jogos. Venha daí então esse remake do Dead Space.



The Callisto Protocol saiu no dia 2 de dezembro de 2022 para PlayStation 5, PlayStation 4, Xbox Series X/S, Xbox One e PC.



Nota: Análise efetuada com base em código final do jogo para PS5, gentilmente cedido pela Ecoplay.

Latest in Sports