Hellblade: Senua's Sacrifice


Vencedor de 3 prémios para melhor Audio Design, Best Performance e Games for Impact em 2017 juntando outros 5 prémios de Artistic Achievement, British Game, Audio Achivement, Game Beyond Entertainment e Performer no recente Bafta Awards 2018, Hellblade: Senua’s Sacrifice foi um puro sucesso na PS4, lançado no dia 8 de agosto do ano passado. E as boas notícias chegaram para os possuidores de uma Xbox One que agora também têm a oportunidade de viver esta obra de arte.
 A narrativa deste jogo é algo invulgar, poucos são os jogos que se focam em temas tão particulares, temas como o medo e a confusão que por vezes se apodera da nossa mente. Hellblade foi um jogo que me deixou totalmente fascinado. Já joguei de tudo, mas este é deveras muito especial. É também importante referir que é um jogo que contém representações de psicose e algumas pessoas podem achar estas representações perturbadoras, fora as cenas violentas que estão também incluídas.

Sem querer deixar quaisquer spoilers acerca da história, a nossa protagonista Senua, guerreira nórdica, tem como objetivo alcançar Helheim para derrotar a Deusa Hela, na esperança de salvar a alma do amor da sua vida. Para tal, vai ter de enfrentar entidades do outro mundo, para além de ter de lutar contra a sua psicose, que engloba vozes e visões que julga serem uma maldição.


A introdução está simplesmente de loucos! Começamos por ouvir uma voz completamente alheia e misteriosa que nos apresenta Senua, que navega numa pequena canoa até ao seu destino. É interessante a forma como esta voz nos agarra e arrepia com um tom que, por vezes, é tão pesado que nos faz vibrar, como se alguém nos estivesse a contar algo ao ouvido num silêncio absurdo. A voz “assombra-nos” pelo jogo inteiro, criando uma atmosfera aterradora como não experienciei antes. Não é de admirar que tenha ganho prémios pelo Audio Design: todo o som ambiente, as vozes, a música, tudo está soberbo, é um dos maiores destaques de Hellblade sem a menor dúvida. É aconselhável usar uns headphones para tirar o melhor proveito possível.

Um ponto invulgar é o jogo não ter qualquer HUD no ecrã nem um único tutorial, fazendo-nos explorar os botões para saber como agir em cada situação a que nos deparamos, mas existem vozes que nos guiam e dão dicas sobre o que temos de fazer para prosseguir. O mesmo acontece com os combates, o tutorial é inexistente e temos de ser nós a explorar os botões e para que serve cada um deles. Temos um para a defesa, dois para atacar e um outro para esquivar, incluindo o de pontapear o adversário para o afastar.

Os movimentos de Senua nas lutas estão surpreendentes, a postura de combate e a forma como maneja a sua espada estão com detalhes muito realistas, já o sangue jorra por todos os lados e a sensação de usar a espada e efetuar cortes profundos nos inimigos é notória. Os bosses são originais, muitíssimo desafiantes e cada uma das lutas é um prazer e vício enorme. São ossos duros de roer, é preciso muita paciência e a melhor solução para os derrotar é usar o excelente sistema de parry que o jogo nos oferece. Em caso de dificuldade, basta prestar atenção às vozes, que informam dos ataques inimigos e de quando nos devemos esquivar e defender. É possível usar o botão de foco para criar um efeito de câmara lenta por um determinado tempo, que dará a vantagem no ataque e deverá ser usado em lutas contra inimigos equipados com um escudo, os quais criam mais dificuldades para serem abatidos.


Hellblade é um jogo linear em que não podemos contar com qualquer mapa, pois a ideia é caminhar e explorar a cada passo dado. Caminhamos sem um objetivo definido ou um caminho traçado e isso torna a experiência interessante, porque nunca sabemos com o que contar e vamos viver momentos de pânico, tensão e desconforto, algo muito raro de se sentir num videojogo.

Inicialmente os puzzles são bem simples, alinhar certas sombras e imagens para criar uma forma que se encontra desenhada no portão usando o foco, mas conforme progredimos as tarefas tornam-se mais complicadas, embora não se tornem nada de extraordinário. Ao longo do jogo, é necessário espreitar por arcos de realidades alternativas e atravessá-los para criar caminhos alternativos para progredir.

Pelo jogo fora encontramos pedras que dão informações acerca da mitologia nórdica e relatam eventos de deuses como Odin e do primeiro gigante Ymir e, claro, Asgard. Além disso, Senua também terá a oportunidade de ouvir os conselhos da sua falecida mãe, que marca presença com o seu rosto nos mais diversos locais como por exemplo em cascatas, rochas e outras partes que complementam a natureza. O game over é do mais original que assisti num videojogo. Por cada vez que somos derrotados em combate, o corpo de Senua putrifica-se espalhando a corrupção pelos vários órgãos. A grande ameaça é que, se essa putrificação chegar à cabeça de Senua, o jogo termina e todo o progresso é perdido, deixando-nos sempre em tensão máxima, como se de um survival horror se tratasse.


O grafismo está formidável, os cenários são lindos e a atmosfera mórbida cria o sentimento de estarmos perdidos na ilha, completamente sós, juntamente com as alucinações a manifestarem-se, o que torna este Senua’s Sacrifice uma experiência visualmente única onde chegamos ao ponto de nos questionarmos o que é real e o que é apenas uma visão. Sem esquecer os momentos em que lutamos contra os inimigos e sentimos a pressão e uma agitada aflição, principalmente em secções do jogo em que podemos visualizar as chamas a consumir uma floresta por inteiro ou um inferno com um rio de sangue durante lutas extraordinárias. As cutscenes parecem retiradas de filmes de culto e o áudio é do melhor que alguma vez pude ouvir num videojogo, desde as ondas do mar aos fortes trovões, é simplesmente perfeito. A banda sonora é arrepiante, deixa o jogador em êxtase tanto num confronto como num simples passeio pelos vales.

O único ponto negativo a referir é a sua longevidade, mas que é certamente recompensada com a jornada de Senua para eliminar todo o sofrimento que ela carrega nos ombros. Infelizmente o jogo está disponível apenas em formato digital. A Ninja Theory poderia, no futuro, pensar em trazer ao público um formato físico, pois um jogo com tal envergadura merece bem um formato assim ou até mesmo uma edição de colecionador. Estamos perante uma verdadeira pérola dos videojogos que, apesar da sua extrema qualidade, poderá ter passado despercebida por muita boa gente por não ser exatamente um "AAA".


O ponto forte em Hellblade: Senua’s Sacrifice é a força que a nossa protagonista procura incessantemente para eliminar toda esta tortura que vive e obter a paz interior de que tanto deseja. Um jogo que representa a batalha que muita gente trava nos dias de hoje como a angústia de perder alguém que amamos, a solidão e o medo que tanto nos assombra e por vezes nos faz perder a cabeça, um tema extremamente forte e uma experiência tão única que ficará gravada na minha memória para sempre. Simplesmente uma obra-prima na indústria dos videojogos.

Nota: Esta análise foi efetuada com base em código final do jogo para a Xbox One, gentilmente cedido pela Ninja Theory.

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