Cocoon


É fácil encontrar na nossa indústria videojogos de altíssima qualidade, produções de excelência que cativam as massas, produtos populares que são originários de franquias que são transversais na cultura pop e até mesmo propostas que, apesar que não terem acertado em cheio num aspeto ou outro, são boas o suficiente para cativarem a atenção do público ao ponto de serem consideradas sucessos comerciais. O que é de rara exceção é ver aparecerem estúdios que, embora não estejam isentos da pressão dos resultados das vendas, conseguem apresentar propostas que abraçam o risco, são disruptivos e desafiam a normalidade. O mercado independente é pródigo nisso pois não está muito amarrado a decisões corporativas mas até aí, nos últimos anos, a propensão para os roguelikes ou para os típicos jogos de plataforma 2D  têm vindo a acentuar-se seguindo a tendência gerada por aquilo que o mercado vai pedindo.
Olhando para isto tudo estavam Jeppe Carlsen (designer principal de Limbo e Inside) e Jakob Schmid quando juntos fundaram o estúdio Geometric Interactive em 2016 e apresentaram Cocoon como o seu primeiro projeto que agora é lançado pela reputada editora Annapurna Interactive.
Coccon é um jogo de plataformas 3D desconcertante, carregado de puzzles onde um besouro (ou algo semelhante) assume o papel de personagem principal num mundo onde a biomecânica é a sua característica principal. Começamos o jogo com o seu (presumível) nascimento e a partir daí temos mundos inteiros para descobrir e infindáveis desafios para ultrapassar.

Num jogo sem diálogos falados ou escritos, apenas podemos usar a nossa capacidade de dedução para tentar discernir quais as motivações por detrás daquilo que experienciamos como "história" mas não é por isso que não nos deixamos de sentir guiados. A progressão narrativa, mesmo sendo muito conceptual, é bastante linear e nunca larga a mão do jogador. Em grande parte "tudo" vai sendo revelado através de pequenos apontamentos que na sua maior parte têm lugar aquando da superação dos bosses finais de cada mundo, mas sempre a deixar a cargo da imaginação do jogador o preenchimento total da narrativa.

As criaturas que encontramos são visualmente coloridas e intencionalmente alegóricas mas sempre misteriosas e estranhas. Cada um dos mundos tem a sua própria cor, a sua própria arquitetura e todos eles apresentam sempre um tipo diferente de desafio ao jogador.


A resolução de puzzles é o pão nosso de cada dia em Cocoon e a sua dificuldade escala à medida que progredimos no jogo. Tal como acontece em relação à sua história, não há nada no jogo que explique o que fazer mas se no inicio tudo o que nos é apresentado aparece com relativa facilidade, a partir de um certo ponto o desafio à mente e o constante teste à paciência passa a conviver matrimonialmente com o jogador.

As peças principais para a resolução de puzzles são umas esferas luminosas e translúcidas que representam cada um dos mundos onde passamos, cada uma com a sua cor e o seu desígnio.
A esfera laranja é a primeira a ser apresentada e carregando-a temos acesso a caminhos invisíveis a olho nu, a esfera verde transforma objetos de estado solido em gasoso (ou vice-versa), a roxa permite ser copiada e teleportada e a cinza dispara lasers que ativam cristais que desbloqueiam novos caminhos.

A utilização das esferas é sempre bastante criativa, abrange a simultânea utilização de todas elas e são igualmente transversais aos vários biomas. De referir que são as próprias esferas que contêm dentro de si os próprios mundos onde se desenvolve a ação do jogo, todos eles tem desafios onde todas as outras esferas podem ser utilizadas. Para entrar nos mundos que estão dentro das esferas basta coloca-las em pequenos lagos que são desbloqueados durante a progressão normal do jogo. Por sua vez nesse mesmo mundo, podemos inserir outra qualquer esfera entrar nela e automaticamente estar noutro mundo completamente diferente instantaneamente. Resumindo... Inception lvl. 99999

No meio desta complexidade é de louvar uma pequena simplicidade. Para os vários tipos de interações apenas temos à disposição 2 tipos de inputs; o joystick analógico para nos deslocarmos e um único botão de interação. Mais. Nada. Não parece grande feito mas não deixa de ser curioso imaginar os puzzles complexos que deverão ter passado pela cabeça de Jeppe Carlsen e seus colegas durante os 7 anos que este jogo esteve em desenvolvimento e no fim a interação com eles é feita da maneira mais simples possível. Obviamente proposital e que de certo modo até eleva a mestria das mecânicas utilizadas.


Cocoon é a prova que não é só o Super Mario que de vez em quando consome cogumelos mágicos.
A Geometric Interactive dá-nos um jogo completamente fora da caixa que entrega uma experiência visual, imersiva e cognitiva que obriga a que as sinapses do nosso cérebro trabalhem horas extra e que nunca nos deixa ficar demasiado confortáveis.

De curta existência mas intenso no seu propósito, Cocoon é obrigatório e essencial na ludoteca não só de quem aprecia resolução de puzzles e de ver o seu intelecto desafiado pelo desconhecido mas também por quem gosta pura e simplesmente de jogar videojogos.

Os puzzles são muitos e variados, todos eles integrados e interligados entre as várias dimensões que fazem parte de uma história que não nos é contada de uma maneira tradicional mas que nos é oferecida visualmente num universo onde a paleta de cores é vibrante e onde a temática visual deambula entre o psicadélico e o alienígena.

Numa indústria onde os videojogos modernos cada vez mais partilham semelhanças entre si, o maior elogio que se pode fazer a este jogo é que, de forma inequívoca, se destaca pela diferença.


Cocoon foi lançado no dia 29 de setembro para Playstation 5, Playstation 4, Xbox Series X|S, Xbox One, Switch e PC e está também incluído no Xbox Game Pass.


Nota: Análise efetuada com base num código final do jogo para PC, adquirido via Xbox Game Pass.

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