Venba

Nos anos 80 o Canadá experienciou um aumento significativo na imigração de pessoas oriundas da Índia, impulsionado por várias mudanças políticas e económicas no país. O governo Canadiano em busca de mão de obra qualificada e diversificada implementou políticas de imigração mais inclusivas, abrindo suas portas a imigrantes de diferentes origens étnicas e culturais.

Para os imigrantes o Canadá oferecia um ambiente acolhedor e multicultural, o que atraía muitos indianos que procuravam um lugar a que pudessem chamar de lar e onde sua cultura e identidade fossem valorizadas e respeitadas mesmo que fossem díspares dos países que os recebiam.

É sobre este pequeno pedaço de história passado nesta linha temporal que Visai Studios desenvolveu Venba, a história de um casal indiano que resolve imigrar para o Canadá nos anos 80 na esperança de ter uma vida melhor para si e para o seu futuro filho.

Não levamos muito tempo no jogo (até porque o jogo é bastante curto) até que as primeiras adversidades neste tipo de situações comecem a ter relevo no desenrolar desta história; a barreira linguística, as dificuldades em arranjar trabalho, as saudades do seu país natal. Tudo pesa e enfraquece aquilo que em tempos foi uma decisão feita com coragem e esperança até ao dia em que nasce Kavin e o casal ganha forças para continuar apesar de todas as dificuldades.

Em cerca de uma hora e meia Venba cobre quase toda uma jornada de uma vida relatada na primeira pessoa, primeiro contada pela mãe que empresta o seu nome a este jogo e numa parte final pelo seu filho Kavin, nessa altura mais adulto e culturalmente cada vez mais desajustado e avesso às origens e cultura dos seus pais.

Com uma vertente extremamente narrativa o jogo foca-se muito no diálogo e na recriação dos temas mais quentes no que toca às vicissitudes da imigração, mas não nos deixa ficar passivos em relação ao que nos está a ser contado. Temos opções de diálogo que aparecem, aqui e ali, não para nos desviar do caminho principal a percorrer, mas com o intuito de levar-nos a descobrir certas nuances secundárias que servem para nos aguçar a curiosidade.

Toda esta história é acompanhada por uma belíssima arte visual. Vibrante e colorida, quase antagónica a uma boa parte dos acontecimentos que se experienciam no jogo, mas que ajudam a que não se perca a sensação de conforto.

A palavra conforto ganha dimensão na mecânica principal do jogo, cozinhar. Embora tenha uma grande dimensão por geralmente estar sempre associada a um evento com significância, tem uma abordagem muito simplificada e simplista. Venba pouco consegue cativar mecanicamente nos momentos em que realmente o temos de o jogar. Talvez o estúdio não quisesse deixar que esta parte do jogo interferisse muito com a cadência daquilo que estava a ser contado. Mas existe algo aqui que foi conseguido com grande sucesso graças à sua vibrante componente visual e também sonora, a experiência sensorial que consegue transmitir durante todo o processo de cozinhar. Desde a música tradicional a tocar no rádio ao som dos ingredientes a ser manuseados e cozinhados, é uma experiencia que se nos deixarmos levar em certos momentos quase conseguimos sentir o aroma aquilo que estamos a preparar.

Olhando para todos os contornos desta história parece-me bastante óbvio que o ato de cozinhar fosse a mecânica escolhida afinal é possivelmente aquilo que nos transporta rápida e facilmente para memorias do passado que nos são queridas e como o escritor angolano Mia Couto escreveu uma vez e muito bem; "Cozinhar não é serviço… Cozinhar é um modo de amar os outros."


Venba é um filme apresentado em forma de videojogo com uma história contada a partir de uma experiência própria destinada a juntar-se a tantos outros testemunhos sobre o quão difícil pode ser a adaptação e a vida de quem é obrigado a imigrar. Conta alegrias e tristezas, enaltece e abraça diferenças entre culturas e gerações, mas acima de tudo provoca reações e incentiva ao pensamento crítico.

Com uma narrativa simples, mas eficaz, uma arte visual aguerrida e experiência sonora de excelência, é pena que o que tenha ficado mais para trás tenham sido as próprias mecânicas de jogo que sendo desinspiradas em nada acompanham todos os outros aspetos do mesmo.

Venba foi lançado no dia 2 de agosto de 2023 para PS5, Xbox Series X|S, Xbox One, Switch, PC e está também incluído no Xbox Game Pass.

Nota: Análise efetuada com base em código final do jogo para PC, adquirido via Xbox Game Pass.

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