Master Detective Archives: RAIN CODE


Quando foi anunciado, Master Detective Archives: RAIN CODE suscitou-me de imediato o interesse. Via claramente que era um novo jogo dos autores de Danganronpa, mas havia ali um pouco que parecia RPG, misturado com uma curiosa aventura gráfica. Fui querendo saber mais, fiquei ainda mais curioso quando o termo “lucid noir” surge, que parecia ser apenas uma junção de palavras fixes mas, fosse como fosse, captou-me à atenção. Resumidamente e, se for definido pela estética do jogo, é uma espécie de mistura entre o estilo de cinema noir e algo de um futuro não muito distante.

Aos que conhecem as aventuras gráficas, recheadas de mistério e um leque de personagens que têm o péssimo hábito de nos levantar mais questões, do que dar respostas, aqui sentem-se em casa. RAIN CODE é tudo isso que já estão habituados e com um certo toque de jogo de ação ou aventura, que traz algo de diferente ao que vimos em Danganronpa e, ao mesmo tempo, elementos familiares. Até porque este jogo me parecia, constantemente, uma bebida bem misturada de muitos outros jogos que sou fã. Mas já lá chegamos.


Neste misterioso jogo acompanhamos Yuma, um aprendiz de detetive com um grave caso de amnésica que me fez revirar várias vezes os olhos. Subitamente estava perante um típico caso de protagonista de RPGs japoneses quando queria, apenas, desvendar um ou vários mistérios. Sendo um jogo de enigmas e mistérios, já habituado ao que vi ser feito em Danganronpa, ignorei esse mesmo cliché ficando à espera de respostas para o porquê de tal coisa ser importante. Até porque há pistas para tudo, muitas delas nas entrelinhas do que as personagens vão dizendo, e isso deixou-me feliz.

O universo de RAIN CODE é um deleite para os fãs de enigmas com muita ficção científica. Yuma, tal como outras personagens que conhecemos pelo caminho, pertencem à World Detective Organization, um grupo de excelentes detetives capazes de usar superpoderes excelentes para desvendar os casos mais complexos. Há quem seja capaz de ouvir o som mais silencioso, encontrar sinais de vida à distância, observar um local no exato momento de um crime ou até mesmo o tempo andar para trás. São vários as personagens, com poderes diferentes, que irão acompanhar Yuma na sua aventura enquanto desvenda enigmas uns atrás dos outros.

Pois como em todos os bons mistérios, há camadas de informação que vamos desvendando pouco a pouco, sempre que resolvemos uma questão ou enigma que, mesmo quando a resposta está mesmo à nossa frente, ela pode não ser assim tão clara. É um mistério criado por uma boa narrativa que RAIN CODE tem, mesmo quando há momentos em que temos uma resposta óbvia à nossa frente e Yuma parece demorar um pouco a atingir. Digo Yuma, mas ele está sempre acompanhado por um misteriosos fantasmas de nome Shinigami que, por algum motivo que não sabemos (novamente, amnésia), há um pacto entre os 2 que não pode ser assim tão facilmente quebrado. Shinigami é muitas vezes um agente desbloqueador que nos apresenta uma possível solução, mas o que senti que esta personagem estava ali a fazer era algo bem claro: fanservice.


Shinigami pode assumir a forma de uma típica mascote, um Jack Frost de Shin Megami Tensei cá do sítio, ou um Zero III de Virtue’s Last Reward, até porque todos têm em comum uma voz aguda que se cravou na minha cabeça. E como mascote, Shinigami é bastante interessante com toda a sua sede por morte ou sangue, que celebrava ao ver corpos mortos enquanto gritava “mistério!”. Mas a sua vertente fanservice é a que acaba por ser mais predominante, pois assuma uma outra forma de uma jovem rapariga que gosta de referir como partes do seu corpo abanam que nem gelatina, e porque é que Yuma não repara nesses seus atributos. Existem ainda todo um leque de animações que me pareciam fazer um certo check a diferentes fetiches ou fantasias sexuais que apareciam… porque sim, sem qualquer razão, só porque o decidiram assim fazer. Ou para introduzir as imensas mecânicas que o jogo nos apresenta.

Como dizia, RAIN CODE é uma espécie de mistura entre vários jogos a que, por acaso, até sou fã. Sendo o mais óbvio Danganronpa, cujas influências são bastante claras, nem que fosse logo pelo estilo artístico do jogo, mas a aventura em si mais depressa me fazia lembrar de uma espécie de fusão entre as séries Zero Escape e Ace Attorney. A primeira muito pelo modo como o mistério é desvendado, uma aventura com imensos toques de ficção científica muito próxima da realidade. A outra, Ace Attorney, pelo modo como exploramos os diferentes cenários à procura de pistas que vamos, depois, usar como argumentos. Argumentos estes que usamos numa espécie de confronto que temos num universo paralelo, um local de nome Mystery Labyrinth que se aproximam imenso às masmorras que temos em Persona 4 e 5. No entanto nelas não há exploração, resumem-se muitas vezes a longos corredores que Yuma corre lentamente enquanto discute temas com Shinigami. De vez em quando surgem pequenos minijogos, mecânicas umas atrás de outras que várias vezes se estendem por demasiado tempo, tornando estes Mystery Labyrinths em algo que me cansava de ver ao fim de meia hora.


Mas são nestes labirintos bizarros onde muitas das pistas que fomos recolhendo são usadas, argumentando contra versões alternativas (quase que imaginárias) de personagens com quem nos cruzamos, sejam elas possíveis criminosos ou apenas alguns indivíduos que querem barrar a nossa investigação. Eles surgem nos Mystery Labyrinths sob uma forma algo diferente, onde temos de “combater” contra eles numa espécie de jogo onde nos desviamos, literalmente, das palavras deles e argumentamos de volta com uma espada, equipada com pistas que fomos encontrando numa fase de exploração prévia. Embora que interessantes, por serem algo de diferente em jogos de investigação ou até mesmo visual novels, por vezes há muita repetição até usarmos a pista certa no momento certo, pois se nos enganamos temos de recomeçar essa parte do combate desde o início.

Foi nestes momentos que dei (ainda mais) valor a Ace Attorney e como uma pista errada era apenas uma explosão na nossa barra de vida e tentávamos de novo, sem recomeçar nada. E RAIN CODE partilha muito desse estilo de jogo, é uma aventura onde não há propriamente muitas escolhas ou caminhos a seguir, mas sim muitas pistas para a resposta certa. Por exemplo, logo no primeiro Mystery Labyrinth temos uma secção on-rails num carrinho de mina onde só progredimos até encontrar a resposta certa, onde os erros custavam um pouco da nossa vida, numa espécie de minijogo do clássico Hugo, mas sem usar o telefone. Mas dá gozo procurar pelas imensas pistas que nos ajudam a desvendar o mistério, nem que seja para melhorar os atributos de Yuma desde a sua vida à velocidade com que nos podemos desviar ou contra-atacar as palavras dos inimigos.


Foram os Mystery Labyrinths das coisas que mais queria gostar no jogo, mas sem efeito, pois constantemente ficava entediado passados alguns minutos e só queria desvendar aquela secção o mais depressa possível, para continuar a boa história que o jogo oferece. E no geral senti que Yuma era demasiado lento em todo o jogo, que todas as áreas que explorava mesmo fora dos labirintos que demoravam mais tempo só porque a nossa personagem era incapaz de correr a uma velocidade decente. Ainda assim, visualmente cada área é rica em detalhe com bastantes pormenores que por várias vezes me deixaram a pensar se, por acaso, não estariam ali pistas importantes. Todas as interações com as imensas personagens que surgem enquanto explorava o mundo do jogo são bastante interessantes, todos os mistérios que temos pela frente têm boas surpresas. Foram várias as vezes que pensei já saber a solução de algo, para rapidamente entrar numa cadeia de deduções, respostas e mais dúvidas que rapidamente se afastavam daquilo que pensava eu estar mais que respondido.


Os fãs de jogos ricos em mistério têm aqui um novo título a explorar que, quem sabe, não se tornará também numa nova série ao nível das que referi nesta análise. Por muito que sentisse que o jogo precisava de andar mais rápido, mesmo quando temos um botão que acelera os combates (ou faz skip a diálogos que já tivemos lido), faltou aqui um ritmo mais rápido para nos levar ao que interessa: a história. Ainda assim estava sempre curioso com o que poderia acontecer a seguir na história, saber mais sobre Yuma, Shinigami e o leque de personagens que nos eram introduzidos a torto e a direito e, ainda, há conteúdos adicionais que exploram ainda mais o jogo. Com momentos excelentes na história, Master Detective Archives: RAIN CODE trouxe-me reações que já não sentia num jogo do género há muito, talvez desde o primeiro Zero Escape!

Nota: Análise efetuada com base em código final do jogo para a Nintendo Switch, gentilmente cedido pela Nintendo.

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