Uncharted 4: O Fim de um Ladrão


Durante a anterior geração de consolas, a palavra "Uncharted" tornou-se sinónimo com "PlayStation 3". A série da Naughty Dog começou por ser uma abordagem moderna ao estilo das aventuras de Indiana Jones e Lara Croft, mas rapidamente conquistou o seu próprio lugar na cultura pop ocidental. Um jogo de aventura com uma apresentação bombástica daria origem à trilogia mais marcante da sua geração, com um final forte e que parecia encerrar a saga... até terem anunciado Uncharted 4, o jogo que tenciona dar uma conclusão às aventuras de Nathan Drake.


Depois dos acontecimentos de Uncharted 3, Nathan tem agora uma vida normal. E enquanto os eventos do jogo não descolam para uma nova aventura, é precisamente essa vida que podemos testemunhar. Desafiando as convenções do género, a primeira hora do jogo é quase desprovida de tiros ou grandes explosões. É aqui que acontece a magia, ao género do melhor drama interativo. Em casa do Nathan, podemos ou não perder-nos no meio de dezenas de artefactos, diários e desenhos das passadas aventuras. Um apelo à nossa nostalgia e à do próprio personagem, que culmina numa fantástica cena ao jantar, no sofá com a mulher Elena. Nunca um jogo retratou tão bem uma cena mundana como esta introdução, onde ao mesmo tempo sentimos a nostalgia do protagonista e a ternura que o prende a esta vida banal depois de tantas aventuras.

Depois de uma incursão por diferentes períodos da vida do Nate que nos dão algum background necessário, é a chegada do irmão Sam que despoleta o arranque da aventura em busca do tesouro de Thomas Avery. Nathan não quer regressar à aventura e quebrar o voto com a sua esposa, por mais que sinta a nostalgia de glórias passadas, mas a vida do irmão está em risco em nome do dito tesouro. A história de Uncharted 4 não é apenas uma partida para a aventura, traz consigo o peso da decisão do protagonista e as consequências da mesma ao longo da narrativa.

Uncharted 4, como os seus antecessores, é um jogo muito linear. A jogabilidade é comparável a um jogo de plataformas 3D com algumas áreas amplas onde é possível explorar um pouco mais, mas consiste essencialmente em ir do ponto A ao ponto B. Pelo meio, muitos saltos em beirais, muros e penhascos, outros mais arrojados com a ajuda de uma corda que magicamente volta sempre para o herói quando já não é necessária (isto é um videojogo, afinal). Por vezes, estas secções incluem alguns puzzles simples, mas interessantes, que envolvem alinhar símbolos ou ativar interruptores. Não é um jogo muito desafiante nestas vertentes, mas é óptimo entretenimento muito por causa dos incríveis visuais.

Por cada sequência de plataformas, há sempre uma sequência de ação e tiroteio. Também aqui não se quebra o formato da série, mas inova-se com um grande leque de opções de stealth, que permitem abordagens diferentes ao combate ao estilo de cada jogador. Em Uncharted, há sempre um número irrealista de inimigos genéricos tendo em conta os locais e o contexto onde aparecem (mais uma vez, é um videojogo), mas neste jogo é possível matar menos deles se forem bastante discretos. Os controlos estão bastante apurados e, com a assistência da mira, é muito fácil livrarmo-nos dos adversários com pouco esforço. Naturalmente, nas dificuldades mais elevadas, alguns inimigos são verdadeiras esponjas de balas, pelo que o desafio se torna bastante superior.


O fluxo do jogo leva-nos a alternar entre plataformas e tiroteios, mas não hesita em interromper para uma grande sequência de história. Há várias incursões ao passado dos personagens e todas em momentos importantes, onde fazem revelações significativas para o enredo. Esta é uma história muito humana e que se desenvolve em várias camadas, incluindo o paralelismo entre o mistério central do jogo em torno do pirata Thomas Avery e o desenvolvimento pessoal dos personagens. Durante a aventura, é muito frequente Nate ir conversando com os companheiros, e não só acerca do caminho a seguir. A história desenrola-se também durante as sequências de plataformas e tiroteios, fazendo disto um verdadeiro drama interativo disfarçado de jogo tradicional. Foi uma grande evolução para uma série que começou por ser um jogo simples com algumas sequências de história. Recomendo que utilizem o áudio do jogo em Inglês, visto que as vozes são uma parte importante da experiência e é possível apresentar as legendas em Português.

A história do Nathan Drake não precisava de um quarto capítulo. Quer tenha sido por pressão da editora ou não que se tenha feito surgir essa "necessidade", o mais impressionante é a forma como este quarto e último episódio conseguiu resultar tão bem em termos de história. A resolução final do emblemático herói é excelente, mesmo que não possa revelar na análise porquê. Não deixa de ser curioso que para uma série tão focada em acção, um verdadeiro blockbuster dos videojogos, tenha deixado uma impressão tão forte pela sua escrita.

Naturalmente, o grafismo de Uncharted 4 é a sua maior atração. Os visuais são simplesmente incríveis, com um detalhe e uma qualidade sem precedentes. Paisagens deslumbrantes, uma iluminação fantástica e uma falta de adjetivos para classificar tudo isto. Não há um capítulo que não tenha novos truques para nos surpreender visualmente e os próprios níveis incluem sempre algumas localizações onde nos podemos perder a apreciar os visuais, do mais pequeno detalhe na proximidade até à linha do horizonte. O jogo não poupa nos detalhes, até no que diz respeito aos movimentos dos personagens secundários que vão acompanhando a aventura. Tudo parece um filme, incluindo o guião.


Uncharted 4 é a grande referência da PlayStation 4 e só pelos visuais já justifica a aquisição da consola. Nota-se no jogo o culminar de toda a experiência adquirida no desenvolvimento da série e no legado da Naughty Dog - há um pouco de todos os jogos da empresa neste Uncharted, desde o mais recente The Last of Us ao mais antigo Crash Bandicoot. Pode não ser o melhor jogo já feito pela empresa, mas dentro dos moldes que a série permite, é o melhor jogo que se poderia fazer.

Nota: Esta análise foi efectuada com base em código final do jogo, gentilmente cedido pela PlayStation. O jogo contém ainda um modo multijogador online, que não foi considerado para efeitos de análise.

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