Fire Emblem Fates: Conquest


Fire Emblem Awakening foi um dos jogos mais importantes desta geração de consolas portáteis, não só por ter sido um excelente RPG tático mas também pelo impacto que teve na visibilidade e popularidade da série no Ocidente. Três anos depois, eis que nos chega às mãos Fire Emblem Fates, um ambicioso RPG que nos coloca em mãos uma importante decisão que muda drasticamente a história e todo o progresso do jogo. Mas será o impacto desta escolha o suficiente para superar um jogo que, para muitos, serviu como ponto de partida para a série Fire Emblem?

Fire Emblem Fates é um jogo com duas histórias, que derivam de uma escolha feita pelo jogador. Duas nações em guerra colocam o protagonista dividido entre a família onde cresceu e que ama desde pequeno (Nohr), e a sua família de nascença à qual foi retirado muito cedo pelo rei da nação rival (Hoshido). Quem adquirir a versão digital, terá de tomar esta decisão durante o sexto capítulo, ficando assim vinculado à versão Conquest (Nohr) ou Birthright (Hoshido), tal como se tivesse adquirido uma destas versões em formato físico. Qualquer que seja o método de compra, será possível adquirir a versão oposta via DLC, assim como uma terceira história onde o herói recusa opor-se a qualquer das famílias. Esta última, chamada Revelation, só poderá ser jogada após se concluir qualquer uma das duas histórias originais.


Embora esta análise seja relativa à versão Conquest, as principais mecânicas de jogo são comuns a todas as histórias, incluindo o Dragon Vein, uma nova mecânica que acrescenta uma dinâmica de transformação do terreno durante as batalhas e só pode ser utilizada pelos personagens da realeza. O jogo inclui 3 modos de dificuldade, começando pelo clássico onde os personagens mortos em batalha desaparecem para sempre (a não ser que se faça reset para voltar ao save anterior) e o "casual" onde os mortos são apenas feridos graves, que abandonam o terreno para curar e voltar no capítulo seguinte. O terceiro modo, "Phoenix", é uma novidade na série para os jogadores que querem apenas focar-se na história, com os personagens mortos a regressar no turno seguinte – mas falando a sério, quem é que vai querer jogar um RPG tático assim?

Conquest é um jogo feito a pensar nos fãs mais antigos de Fire Emblem e que gostam de um bom desafio, com recursos limitados tanto a nível monetário como de experiência. A escolha deste caminho implica uma dificuldade acrescida, mas não só por estas restrições: muitas batalhas oferecem objetivos diferentes de se matar um boss ou eliminar todos os inimigos, ou são novas experiências com cenários inovadores. É muito normal ter-se uma grande inferioridade numérica em relação aos adversários, sendo muito importante a estratégia e a utilização dos mecanismos que a arena oferece. Há cenários onde até seria possível cumprir o objetivo sem combater nenhum adversário, não fossem estes sempre tão agressivos perante as nossas tropas. Dizer mais do que isto iria estragar algumas surpresas, mas realmente não se pode dizer que esta versão do Fire Emblem Fates seja "mais do mesmo".


E se o combate é bastante inovador, o estilo artístico é bastante conservador. A guerra entre Nohr e Hoshido representa as dualidades Ocidente vs. Oriente e Escuridão vs. Luz, pelo que os protagonistas de Conquest têm um design bastante europeu, à semelhança do habitual na série, mas com estilos e armaduras que facilmente associaríamos aos vilões. As classes e armas dos personagens serão bastante familiares dos fãs de Fire Emblem, embora tenha havido no jogo uma larga revisão do sistema pedra-papel-tesoura de forma a acomodar outros tipos de armas, associadas aos Hoshidans.

Escolher Nohr não é tomar o partido dos vilões. Os príncipes da sombra são liderados por um pai tirano, o rei Garon, que pretende conquistar Hoshido a qualquer custo, mesmo que isso implique sacrificar o filho adotivo ou outro qualquer. Corrin, o protagonista, é um pacifista que quer acabar a guerra e sonha com um mundo onde as suas duas famílias se possam entender. A sua escolha foi uma escolha de afecto, pois ama e sente o amor dos irmãos com quem cresceu, mesmo não sendo a sua família de sangue. No entanto, custa-lhe imenso combater contra os que partilham o mesmo sangue e que o viram ser roubado à família. Em Conquest, Corrin terá de aprender a lidar com as consequências da sua escolha, mesmo que ninguém além dos seus irmãos o possa compreender. Será possível destronar o rei Garon sem que os irmãos de coração o vejam como um traidor? E será que algum dia os irmãos de sangue poderão entender a decisão de voltar para Nohr?


O enredo é a melhor parte do jogo. A história do jogo lida com temáticas muito interessantes, além dos típicos temas de honra e glória, incluindo traições e até mesmo a ética em tempo de guerra. Um pacifista que pretende conquistar o território oposto e destronar o seu próprio rei, tudo em nome da paz, terá de enfrentar sérios dilemas. Se ao longo do jogo a história se vai desenrolando com a vida dos adversários a ser poupada (se os inimigos jogam em "casual", por que haveríamos nós de jogar em "classic"?), quando algum personagem morre acaba por ter um maior impacto na história.

O jogo tem 28 personagens recrutáveis na história principal, a maioria dos quais tem uma história bastante interessante, embora também haja muitos que simplesmente aparecem e se juntam ao combate só para o jogador ter mais escolhas para o seu exército. A que mais se destaca é a Azura, uma princesa de Nohr que tinha sido raptada pelos Hoshidans mas que estes expulsaram depois de Corrin ter escolhido o caminho oposto. Os irmãos recebem-na de forma calorosa, mas rapidamente se percebe que há muito por explicar acerca do seu passado.

   

Se há um grande defeito a apontar ao Fire Emblem Fates, não será pela história nem pelas batalhas, mas sim pela maneira forçada como incorpora vários elementos que a série introduziu em Fire Emblem Awakening. Começo por dizer que a mecânica de relacionamentos é fantástica e olhando para o futuro deve mesmo ser um standard na série. Personagens que estejam colocados lado a lado ou emparelhados no terreno irão ajudar-se entre si durante as batalhas, melhorando assim o seu relacionamento. Quanto mais sobe o nível do relacionamento, melhor será a colaboração em batalha, e se um par atingir o nível máximo, resultará num casamento do qual nascerá um filho. E aqui começam os problemas: os filhos não fazem qualquer sentido! Ou melhor, faz sentido que os personagens possam ter filhos, mas a forma como estes personagens são tratados é absurda.

Para perceber o problema é necessário explicar os Deeprealms, que são dimensões paralelas onde o tempo corre de forma diferente. Estes têm um papel relevante na história de Conquest, mas são também utilizados como desculpa para uma série de elementos desconexos da história principal. De cada vez que se acaba um capítulo, regressamos a um Deeprealm onde temos o nosso próprio castelo e alojamos todos os membros do exército. Como o tempo funciona de forma diferente, podemos lá passar o tempo que quisermos e até visitar os castelos de outros jogadores encontrados via StreetPass ou através da internet, seja para socializar ou para combater. E é também lá que os personagens se dedicam a desenvolver as competências interpessoais. Quando dois deles se casam, decidem colocar o bebé num Deeprealm só para si mas, como o tempo é muito relativo, ficam espantados ao ver que o bebé aparece logo adolescente ou até mesmo adulto – como o tempo voa num Deeprealm!

Os filhos não têm qualquer papel na história, tal como tudo o que acontece no castelo, excetuando as aquisições de materiais, experiência e níveis de relacionamento. Mas o castelo é a base de operações personalizada do jogador, onde até pode haver uma sauna e uma prisão onde se podem recrutar inimigos genéricos a troco da sua liberdade. E se, ao contrário do que acontecia em Awakening, onde tudo estava bem integrado, nenhum destes elementos parece ter boa aderência ao núcleo do Fates, o futuro da série poderá passar por um conceito semelhante onde se vão adquirindo packs de histórias dispersas a partir de uma base numa dimensão paralela. No presente, o castelo serve para toda a gestão que não encaixa na história e os filhos servem para aumentar a lista de personagens.


Fire Emblem Fates: Conquest, tanto como jogo "principal" ou como DLC, é uma grande história. Durante o decorrer do jogo, surge muitas vezes a curiosidade de ver como será o caminho oposto, de acompanhar os Hoshidans na defesa do reino, o que tive a oportunidade de fazer durante esta análise. Há pontos em que as duas histórias se cruzam, mas de forma geral são bastante diferentes. Conquest traz uma história mais complexa e emocionalmente pesada para o protagonista, o que faz com que seja mais interessante, mas é também um jogo mais difícil.

Olhando para Fire Emblem Fates como um todo, pode não ser tão consistente como o anterior Fire Emblem Awakening, mas oferece uma trama mais densa e com personagens mais interessantes, dividida num total de 3 histórias diferentes e cada uma com a duração típica de um jogo da série.
Nota: Esta análise foi efetuada com base em código final do jogo para a Nintendo 3DS, gentilmente cedido pela Nintendo.


Latest in Sports