RoadCraft
Pacífico e terapêutico ou lento e monótono? É uma discussão que sobe sempre à tona aquando do lançamento de jogos como Farming Simulator, Euro Truck Simulator, RoadCraft e deste género de simuladores no geral, espalhando-se até para lá destes jogos e infetando jogos como Death Stranding, recentemente. Normalmente, eu costumo cair do primeiro lado da barricada, sendo da opinião de que existe e deve continuar a existir espaço para este tipo de jogos, por muito difícil que seja explicar o seu apelo a alguém que não joga videojogos.
RoadCraft é, provavelmente, o melhor jogo deste género que já joguei. Não só acerta perfeitamente na vertente terapêutica destes jogos, sendo jogado de forma lenta e calculada e apenas desta forma, como também é surpreendentemente complexo e conta com uma componente de exploração que é um dos seus pontos mais fortes
Esta foi a minha primeira experiência com um simulador da Saber Interactive, nunca tendo jogado SnowRunner ou MudRunner. Não conheço, portanto, o nível de complexidade desses jogos, mas foi esse o aspeto que imediatamente me impressionou nos primeiros momentos de RoadCraft. Começamos com um simples veículo batedor, uma carrinha cujo único uso é explorar a área e ajudar a mapear estratégias para, mais tarde, utilizar todo o tipo de veículos e ferramentas para completar os objetivos de cada mapa. São estes veículos que trazem este impressionante nível de complexidade.
Por exemplo, para a simples tarefa de construir uma estrada, são necessários quatro veículos: um camião para transportar e despejar a areia, um trator de rastos para a alisar, uma pavimentadora para colocar o asfalto e, por fim, um rolo para compactar o asfalto e assim se faz um caminho perfeito para os condutores controlados pela IA deixarem de reclamar de cada vez que encontram o mais pequeno obstáculo.
Mas claro que a grande atração (ou detração, para muitos) é a paz de estar sozinho num mundo enorme; literalmente o único construtor enviado para lidar com todo o tipo de desastres naturais. Em RoadCraft é valiosa a paciência e a atenção ao detalhe. Se te esqueceres de alisar a areia que despejaste, vais construir uma estrada. Se não tiveres atenção ao terreno e ao peso daquilo que estás a levantar, é provável que a tua grua capote, o que te vai custar tempo precioso. Por vezes este nível de realismo e complexidade podem ser frustrantes; nem sempre temos a disposição necessária para ter atenção todos estes aspetos e operar maquinaria pesada com o mesmo nível de cuidado que na vida real. Mas, para a pessoa certa, com o estado de espírito adequado e uma boa dose de paciência, RoadCraft pode evocar um tipo de magia e paz possível apenas com simuladores extremamente realistas.
Este é um jogo lento. A maioria dos objetivos implica utilizar o veículo batedor para explorar a área e formular um plano, muitas vezes fazendo longas viagens por terrenos difíceis, e apenas depois regressar a uma das garagens para pegar nos veículos necessários, um a um, e fazer a mesma viagem, agora em veículos muito mais difíceis de manusear. Por muito que eu tenha gostado de RoadCraft, a minha experiência com este jogo fez-se em segmentos de uma hora ou pouco mais, já que, assim que a calma e a paz necessárias para o jogar se começavam a transformar em frustração e repetidas tentativas falhadas de perceber o funcionamento da grua, era altura de jogar algo diferente.
RoadCraft é um bocado como limpar a casa. Na maioria dos dias, pode parecer aborrecido e a última coisa que nos apetece fazer, principalmente quando (e isto é especialmente verdade nos videojogos) há sempre uma alternativa mais obviamente divertida, atraente e apetecível. Mas por vezes, com a mentalidade certa, pode ser uma atividade terapêutica durante e gratificante após. Em RoadCraft esta última parte é ainda mais verdade quando consideramos que aquilo que estamos a fazer é reconstruir cidades devastadas por desastres naturais. Se nos deixarmos submergir totalmente na narrativa deste jogo, este passa a ser não só satisfatório no sentido de olhar para trás e ver tudo o que fizemos, como o nosso trabalho ganha todo um novo sentido de gratificação.
Quando passamos, no entanto, destes trabalhos práticos, para a parte mais logística, de gestão de recursos, por exemplo, que inclui a necessidade de utilizar um veículo específico para recolher materiais recicláveis ao longo do mapa, RoadCraft perde-me um bocado, mas simplesmente porque essa não é uma área dos simuladores que me apela tanto como o próprio ato de construir uma estrada, colocar cabos elétricos ou substituir canos gigantes. Alguns destes trabalhos serão, certamente, menos aborrecidos quando feitos em equipa, de forma online, já que esta pode ser organizada de forma a cobrir todas as funções necessárias sem a necessidade de dedicar uma viagem inteira apenas a esse propósito. Os próprios menus são, por vezes, demasiado complexos para o seu próprio bem, tornando-se complicado encontrar rapidamente aquilo que procuramos, mas esse não é um problema grande o suficiente para influenciar negativamente a minha experiência.
RoadCraft é uma das maiores surpresas do ano até agora e certamente um dos melhores jogos que joguei em 2025. Certamente não será do agrado de todos, mas tenho a certeza que encontrará muitos fãs entre o círculo de apreciadores de simuladores. Com uma dedicação ao realismo, sem nunca se esquecer de ser um videojogo antes de um verdadeiro canteiro de obras, RoadCraft atinge um balanço notável entre os dois, que faz dele uma experiência fascinante.