God of War


God of War, uma das séries mais reconhecíveis do universo PlayStation, está irreconhecível. Ao fim de quase 5 anos de desenvolvimento, Kratos está de volta com um novo visual, num novo mundo e com um novo sistema de combate neste novo God of War, sem número ou subtítulo. Mas isto não é um "reboot".

Quando se propôs a reinventar a série, o Santa Monica Studio disponibilizou-se a abalar todas as convenções de títulos anteriores, menos a mais importante de todas: a história do protagonista. Kratos mudou, sim. Procurou um recomeço no Norte, mais propriamente em Midgard, onde se exilou e construiu uma nova família, mas a sombra do seu passado pesa em todas as suas ações e decisões.

A história começa com o falecimento de Faye, a companheira de Kratos e mãe de Atreus, cujo último desejo foi que as suas cinzas fossem levadas ao cume da mais alta montanha. Agora que se encontra a sós com o filho, Kratos tem a enorme responsabilidade de o educar e proteger. Atreus desconhece a sua linhagem e a natureza do sangue que lhe corre nas veias, um segredo que Kratos se esforçará por proteger enquanto embarcam numa enorme jornada que mudará para sempre a vida de ambos.


A relação entre pai e filho, das inseguranças aos conflitos, é o fio condutor de uma história épica que irá meter ao barulho os próprios deuses nórdicos, nada contentes por haver um deus estrangeiro a deambular pelas suas terras. Uma enorme história de fantasia que remete para a era dourada dos jogos RPG, com momentos verdadeiramente surpreendentes e um argumento envolvente que nos coloca mesmo na pele de Kratos. Um jogador que dê início a esta jornada não imagina o que o espera, mas é precisamente isso que fará desta uma experiência tão empolgante.

Em vários aspetos, o jogo assemelha-se mais a um clássico do que a um jogo moderno. Numa altura em que a tendência é fazer jogos de mundo aberto e exploração livre, histórias dinâmicas e jogabilidade "sandbox", God of War é um jogo linear com uma jogabilidade muito restrita. Contém bastantes elementos modernos, como a jogabilidade assente na dinâmica entre duas personagens, que se popularizou desde The Last of Us, mas a principal sensação que o jogo transmite é a de estarmos a jogar um grande clássico, com influências de séries tão díspares como antigos jogos de Tomb Raider, Metroid ou Final Fantasy.


Sendo um jogo de ação, o sistema de combate é vital para o seu sucesso. Em God of War, Kratos está armado com um machado especial com magia de gelo e que pode ser utilizado como arma de arremesso. A qualquer momento, podemos atirar o machado contra um inimigo e depois chamá-lo de volta, danificando também quaisquer outros que se coloquem no caminho. Sendo um machado, é também bastante útil no combate corpo-a-corpo, com ataques fracos e fortes à disposição para utilizar em conjunto com o escudo ou simplesmente desviar. O machado pode ser guardado (ou estar em utilização fora das mãos de Kratos) e, nesse caso, temos acesso ao combate desarmado que, embora dê menos dano, tem maior poder de atordoamento dos inimigos, deixando-os vulneráveis. No nível de dificuldade normal, o jogo oferece um óptimo desafio para o jogador comum, onde não se pode facilitar, mas há também dois modos de dificuldade mais intensa para quem procura um desafio mais "a sério". Por outro lado, há também um modo mais fácil para quem apenas queira seguir a história, o que é óptimo pois esta é uma história que vale a pena seguir.

Durante o combate, Atreus vai ajudando com as flechas do seu arco que, embora infinitas, têm um período de espera associado. Pelo meio, Kratos vai acumulando a sua caraterística raiva espartana, que depois poderá descarregar em furiosos golpes sobre os adversários. Numa fase inicial do jogo, o combate começa por ser bastante simples, mas vai ganhando cada vez maior profundidade à medida que se vai progredindo e acumulando novas habilidades, tanto para Kratos como Atreus. O jogo tem uma pequena componente de RPG que oferece XP como recompensa por vencer as batalhas ou cumprir certos objetivos dentro ou fora do combate. O XP não melhora automaticamente as personagens, mas pode ser utilizado para desbloqueio ou melhoria de várias habilidades que, por sua vez, terão impacto no sistema de combate.


Há um sistema robusto de equipamento, que inclui armaduras e artefactos ("encantamentos") que podem ser combinados livremente para aumentar as estatísticas do Kratos de acordo com a preferência do jogador. O mesmo também acontece com Atreus, embora de forma mais simples, onde o equipamento irá afetar o seu comportamento em batalha, podendo ser mais agressivo ou defensivo, por exemplo. Um pouco por todo o lado do mapa iremos encontrar os anões responsáveis pelas melhorias de equipamento, duas personagens cómicas que brincam até com o facto de estarem em toda a parte, incluindo sítios onde Kratos tem de passar por grandes tormentas para lá chegar.

Com o avanço na sua jornada, Kratos e Atreus irão adquirir habilidades especiais que desbloqueiam novos caminhos em locais já visitados, abrindo as portas a algum backtracking. Muitas vezes, será a própria história a forçar o regresso a certos locais, mas a partir de certo ponto no jogo será o próprio jogador a aventurar-se pelo mapa em busca de segredos e missões secundárias, que poderão levar a encontrar grandes tesouros ou inimigos formidáveis. O ritmo do jogo vai fluindo entre combate, puzzles e o seguimento da história, mas a mesma foi desenvolvida com momentos "ideais" para a exploração livre, mesmo que Kratos, pessoalmente, não seja grande fã de distrações em relação à sua missão. Mesmo sem distrações, esta é uma aventura com mais de 25h, que se poderá extender por mais uma dezena para quem gosta de desvendar todos os segredos.


Midgard é, de facto, um mundo fantástico para visitar. As primeiras imagens do jogo podem dar a entender o contrário, com paisagens gélidas em torno de toda a casa de Kratos, mas há imenso para ver neste mundo e cenários absolutamente deslumbrantes. O jogo tem uma arte magnífica que vai muito para além dos detalhes nos cenários, as texturas e os efeitos de partículas. As cores! Até nisto o jogo foge da tendência em jogos modernos classificados para adultos, muitas vezes tão cinzentões na sua tentativa de mostrar seriedade. Muitos foram os momentos de fazer cair o queixo, apresentados com uma cinematografia surpreendente.

Esperava-se isto de um high-fantasy RPG, mas aqui está God of War com um dos jogos mais belos dos últimos anos. Belo e grotesco, pois não houve qualquer sacrifício na violência com que alguns dos inimigos são executados. A parte técnica é impressionante e mesmo jogando numa PlayStation 4 num televisor HD, sem tirar partido da resolução melhorada ou do efeito HDR, é facilmente um dos melhores desta geração. A majestosa banda sonora que o acompanha, parte do tema principal da série para as influências nórdicas. Um excelente trabalho de Bear McCreary, compositor com bom historial do mundo do cinema e televisão.


Uma nota importante para o trabalho de realização feito com a câmara do jogo. Fosse isto um filme e diríamos que foi filmado com uma única câmara, sem cortes, pois é mesmo isso que o jogo apresenta, com a imagem sempre por trás do Kratos e uma perspetiva guiada, embora manualmente ajustável. Está mesmo muito bem feito, como quase tudo o resto no jogo. Não é perfeito, naturalmente, certamente não irá agradar a todos, mas é inegável que foi feito com uma qualidade muito acima da média.

Kratos mudou e God of War também. O resultado foi um clássico moderno de fantasia e acção, com uma apresentação cinemática e gráficos incríveis, mas acima de tudo uma história envolvente que prende o jogador do início ao fim. Um jogo verdadeiramente obrigatório para qualquer possuidor de uma PlayStation 4.

Nota: Esta análise foi efetuada com base em código final do jogo para a PlayStation 4, gentilmente cedido pela SIEE, e testado num modelo original da consola PS4. Todas as ilustrações têm origem em imagens promocionais oficiais.


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